A liberdade que começa atrás das grades

O projeto Universal nos Presídios (UNP), em sua versão feminina, luta para levar a transformação de vida a quem se via sem esperança

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No sistema penitenciário brasileiro há cerca de 45 mil mulheres presas por envolvimento direto ou indireto com crimes, segundo levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça. O que os dados não mostram são todas as dificuldades pelas quais elas passam.

“Vários fatores levam uma mulher a entrar para o crime. Ela pode ser seduzida pelo desejo de ostentação quando o que ela tem não lhe parece suficiente”, explica a missionária Luciene de Almeida, (foto abaixo) encarregada pelo braço feminino do projeto Universal nos Presídios (UNP), coordenado internacionalmente pelo Pastor Clodoaldo Rocha.

Outra causa, segundo a missionária, é a influência dos namorados, companheiros e maridos criminosos. “Quando ela quer ter aquele homem a qualquer custo, entra para o tráfico e faz de tudo por ele. Normalmente, ele vai preso e muitas mulheres se submetem a levar drogas ou até seguir com o trabalho que ele fazia e são presas”, continua Luciene. Por isso, o UNP feminino tem um importante papel na vida dessas mulheres.

Chamado desafiador
O UNP faz um trabalho socioeducativo que inclui palestras sobre saúde, conversas francas, atenção e apresenta a única forma real que favorece a mudança de vida: a obediência à Palavra de Deus. “Dar um simples abraço em uma detenta mostra o valor que ela tem para Deus e para nós. Realizamos reuniões lá dentro, como é feito nas igrejas, com orações, o momento da Palavra, o batismo e a Santa Ceia.

Também distribuímos o jornal Folha Universal, Bíblias, livros e kits de higiene. Muitas se rendem ao Senhor Jesus, são transformadas dentro do presídio e, quando isso acontece, o alvará de soltura (documento oficial que garante a saída da prisão) já se torna uma consequência, algo que vai acontecer, mas a ansiedade já não é mais a mesma”, diz Luciene.

Parece pouco, mas não é
Pastores, suas esposas e voluntárias acompanham as detentas nas unidades prisionais, fazem reuniões e palestras, oferecem cursos profissionalizantes e arrecadam o material que será doado a elas. Recentemente, aconteceu uma entrega especial de itens (papel higiênico, pasta e escova de dentes, sabonete e absorvente íntimo) angariados pela Força Jovem Universal (FJU) em vários Estados. Foram 12.107 kits entregues em 15 Estados brasileiros. As demais unidades da federação serão contempladas em breve.

As boas sementes plantadas pelo UNP feminino germinam além das grades. Histórias a seguir mostrarão exemplos e poderão ser conhecidos mais detalhes deste trabalho.

Seduzida pelo crime
Aos 22 anos, Leda Souza, (foto abaixo) hoje com 42 e moradora de Campinas, interior de São Paulo, trabalhava em um bingo. Foi ali que teve contato com criminosos de vários tipos e o “ganho fácil” a seduziu. Ela começou a praticar estelionato e “evoluiu” no mundo do crime: passou a falsificar documentos e a práticas mais pesadas. “É como em um videogame: você passa pelas fases e acha que fica mais forte”, lembra Leda, que chegou a integrar o chamado “tribunal do crime”, que executa pessoas de acordo com os interesses da quadrilha. “Eu me oferecia para praticar torturas e mortes e sentia prazer nisso. Estava endemoniada.”

Aos 33 anos, Leda foi presa. Não aceitava ser punida e se via como vítima. “Sofri muito. Por causa de mau comportamento, fui castigada muitas vezes. Em uma delas me trancaram vários dias em um lugar escuro, sem comida e sem água. Bebi minha urina para não morrer de sede. Uma voz a todo instante falava que eu precisava me vingar de todos que estavam me fazendo sofrer daquele jeito”, conta.

Ela relata como conheceu o trabalho do UNP: “eu frequentava as reuniões, mas não acreditava que para mim houvesse solução. Ouvia as pessoas que fiz de vítimas me chamando e ficava perturbada. Quis tirar minha própria vida e dar um basta àquelas vozes”.

Propaganda enganosa
Leda cita algo curioso: “eu desabafava com criminosos e falava das perturbações, mas todos falavam: ‘ah, isso é normal’. Eles sabiam que quem comete crimes paga o preço, mas ninguém conta isso para você quando o incentiva a entrar nessa vida”.

Aos 36 anos, Leda ganhou liberdade condicional, mas ainda teria de responder aos processos. Lembrou-se do carinho genuíno das voluntárias do UNP, ligou a TV e procurou a programação da Universal. Estava passando a Vigília de Virada de Ano de 2016 para 2017 e um ponto de oração era o suicídio. Algo foi despertado nela.

Ela frequentou as reuniões, inclusive as de libertação. “Liberta, comecei a acompanhar o trabalho do UNP fora das grades e aprendi que se me entregasse a Deus de verdade poderia ter o Espírito Santo e quis recebê-Lo. Não me deixaram sozinha, me deram atenção e iam me pegar para levar às reuniões. Numa Fogueira Santa, me lancei no Altar. Queria o Espírito Santo.”

Vitórias inesperadas
Leda foi julgada e sentenciada a voltar para a prisão e cumprir mais sete anos. Resignou-se. “Mas, quando fui ao fórum para formalizar tudo, disseram que eu estava livre e não teria de voltar. O advogado não conseguia explicar. Isso aconteceu em uma segunda-feira. Na quarta-feira, fui agradecer a Deus e recebi o Espírito Santo logo na primeira oração.”

Hoje muitos reconhecem sua mudança. “Pessoas de dentro e de fora do crime se dizem admiradas. Me diziam que eu tinha um rosto sombrio e que hoje veem leveza nele. Minha família me aceitou e no UNP posso ajudar outras presas”, comenta. Atualmente, ela trabalha no ramo de marmitas.

“O UNP me mostrou que onde Deus estiver, a liberdade está e que enquanto houver vida há esperança. É isso que passo hoje para outras mulheres”, conclui.

“Queria dinheiro e mais dinheiro”
A carioca Daiana de Souza, (foto abaixo) hoje com 34 anos, tinha uma vida tranquila até os 20, quando começou a ser seduzida pelas “conquistas” financeiras de conhecidos que praticavam crimes. “Pedi a um rapaz que me indicasse e ingressei no tráfico de drogas. Só queria saber de dinheiro e mais dinheiro”.

Em casa, sua mãe tinha sérios problemas de saúde, apesar de ajudar a cuidar da filha que Daiana teve quando ainda era solteira. A moça foi presa. “Na prisão, bateu revolta, pois meu advogado me contou que minha mãe piorou muito e eu não podia cuidar dela. A vida na prisão é muito precária. A comida chegava estragada e passávamos o dia inteiro com um gole de café e um pedaço de pão. A higiene pessoal era quase impossível. Remédio nem existia lá.”

Como ouro
Para as mulheres, a higiene é mais difícil, principalmente em alguns períodos do mês. Foi essa necessidade que fez Daiana acordar para o fato de precisar dos kits distribuídos pelo UNP. “Aquilo era como se entregassem ouro nas minhas mãos e fiquei me perguntando por que se importavam conosco. Eu frequentava as reuniões, mas estava confusa e preocupada com a minha mãe.”

A jovem passou para o regime semiaberto e depois para o aberto. “Saí da prisão desorientada emocionalmente. Vivia nervosa e preocupada”, revela. Quando perdeu a mãe, ela desabou. “Percebi que precisava do que eu ouvia das mulheres do UNP. Elas diziam que só o Espírito Santo é capaz de nos dar a paz. Me apeguei a isso e descobri que o UNP poderia me ajudar aqui fora. Deus fez a mudança na minha vida e hoje estou livre, sou casada, tenho filhos e estou na presença dEle.”

Para ela, o que aconteceu serviu de exemplo para nunca mais errar, buscar o Espírito Santo com muita intensidade e assistir às reuniões.

“O UNP ainda me presta assistência. Graças a Deus, recebo uma cesta básica e até cuidam de meus filhos para que eu possa estudar. Deus me abençoa grandemente. Não é fácil. A luta e a guerra vêm, mas agora tenho o Altíssimo ao meu lado guerreando, pelejando por mim.”

Daiana trabalha como vendedora autônoma, mas aproveita para fazer todos os cursos do UNP. “Já fiz os de manicure, design de biscoitos, doces e quero fazer muitos ainda e montar meu próprio negócio.”

De detenta a empresária
Quem vê hoje Débora Sampaio, (foto abaixo) uma empresária de 64 anos com um sorriso no rosto e fala simpática, não imagina os caminhos tortuosos percorridos por essa moradora de Praia Grande, no litoral paulista.

Quando jovem, ela morava no Rio de Janeiro e, durante uma viagem de férias a São Paulo, conheceu um rapaz. “Namoramos cerca de um ano e engravidei dele. Resolvemos morar juntos”, conta Débora, que não sabia que ele era traficante. “No dia que nos mudamos, fui presa com ele, como cúmplice.”

Assim começou a trajetória de Débora no crime. Saiu da cadeia, perto de dar à luz. Seu companheiro ainda ficou preso cerca de três anos e voltou às atividades ilegais asim que foi solto. “Vivi em meio ao tráfico, aos roubos, ao estelionato, a muitas prisões e a perseguições. Foi um verdadeiro inferno. Isso durou 22 anos e tive quatro filhos. Perdi dois para o tráfico e um bebê por uso de drogas.”

Débora traça seu perfil naquela época: “eu era fria, amargurada e sem autoestima. Fui presa novamente e mandada para a Penitenciária Bangu 8, no Rio de Janeiro, em 2012. Fiquei presa pouco mais de um ano.” Mas, desta vez, a liberdade teve início atrás das grades. “Lá comecei a me libertar completamente, de corpo e alma, porque finalmente entendi, com a ajuda das voluntárias do UNP, o que faltava na minha vida. Comecei a ouvir e a aprender a Palavra de Deus, encontrei meu Senhor Jesus e, de volta a São Paulo, procurei ajuda na Universal.

Conheci o projeto Raabe e consegui me libertar dos vícios e dos demônios que me atormentavam. Aprendi que precisava morrer para aquele mundo nojento e me batizei nas águas. Hoje, com o Espírito Santo em mim, sou cheia de vida. Me preparo para ser obreira e faço parte do UNP há quatro anos.”

Seu relato não termina aí: “trabalho com pessoas que me respeitam, sou valorizada e creio que serei usada para ganhar muitas almas nos presídios. Vou ajudar mulheres que sofrem o que um dia sofri”, diz. Hoje ela é diretora-executiva da própria empresa, especializada em artesanato e cozinha artesanal.

Essas são algumas dentre milhares de mulheres que escolheram fazer a diferença, em nome do Senhor Jesus, na vida das pessoas. Outras engrossarão as tropas contra o mal que assola a parte do mundo que ainda não optou pela Salvação. A inspiração vem dAquele que veio ensinar sobre amar o próximo e que está escrito em Mateus 25.36: “Estive na prisão, e foste Me ver.”

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Colaborador

Marcelo Rangel / Fotos: Mídia FJU e Cedidas