Quanto custa a falta de sinceridade?

Ao flertar com a mentira, com o caráter dissimulado ou mesmo com o autoengano, muitos convivem com a farsa de ser quem são. Afinal, como se livrar disso?

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Todos nós, hoje em dia, temos acesso à maquiagem. Não se trata daquela referente ao arsenal feminino composto de corretivo, blush, base ou pó facial, por exemplo, mas daquela que busca mascarar, disfarçar, amenizar ou até ocultar aquilo que somos.

Assim, uma pessoa pode estar lidando com o ápice da solidão e, simultaneamente, esbanjar felicidade em festas, viagens frequentes e posts recheados de frases de efeito nas redes sociais.

Essa realidade adulterada e manipulada por algumas pessoas coloca famosos e anônimos no mesmo nível, além de criar fantoches dispostos a jogar a sinceridade para debaixo do tapete e manter sua aparência em um pedestal.

Há pessoas, por exemplo, que escondem o fim de um relacionamento enquanto vestem o figurino de que está tudo bem na sua vida. Há também aquelas que, ao lidar com o sucesso que não lhes pertence, erguem o discurso de “mais merecedoras” para justificar sua inveja. E nem as autointituladas perfeccionistas ficam fora desse rol, quando se apropriam de palavras com ares de virtude e que, muitas vezes, não passam de um disfarce para não fazerem o que é necessário.

Não é difícil imaginar falsos, dissimulados, hipócritas e uma geração de atores de primeiro escalão forjados nas próprias mentiras. Gente que interpreta um papel, manipula a voz e modifica até a frequência respiratória para transparecer uma alma imaculada travestida das melhores intenções. Também não é difícil entender, em um mundo onde a palavra fake vai além das notícias, o valor da sinceridade. Para algumas pessoas, ela custa um pouco mais do que para outras, mas é indiscutível a recompensa que ela dá a qualquer uma delas.

Não é à toa que a sinceridade é extremamente atraente. A Bíblia descreve que “quem anda em sinceridade, anda seguro (…)” (Provérbios 10.9) e que é com os os sinceros que Deus busca ter intimidade (Provérbios 3.32). Em um mundo fermentado de maldade e malícia (1 Coríntios 5.8), a sinceridade nos faz viver de um modo particular (2 Coríntios 1.12).

SINCERAMENTE…
A mensagem deixada em Isaías 28.15 mostra vestígios de um comportamento corrosivo: “Vocês se vangloriam, dizendo: (…) Quando vier a calamidade destruidora, não nos atingirá, pois da mentira fizemos o nosso refúgio e na falsidade temos o nosso esconderijo”. Isso demonstra que não é de agora que a mentira e a falsidade seduzem a muitos. O assunto foi abordado recentemente no programa Inteligência e Fé, da Rede Aleluia de rádio, pelo Bispo Renato Cardoso, que ressaltou que o pior tipo de engano que existe é enganar a si mesmo. “Como pode uma pessoa ser tão tola, tão ignorante de como a vida funciona, a ponto de pensar que a mentira é um refúgio e que pode se esconder debaixo da falsidade? (…) A mentira é um perigo, é uma casca de banana, uma areia movediça, ou seja, que não fica firme por muito tempo”, observou.

É provável que todos nós conheçamos a história de Jó, um homem que valorizava a sinceridade. Certa vez, Satanás resolveu questionar a verdade sobre ele, sugerindo a Deus que ele não passava de um interesseiro, como podemos ler em Jó 2.3: “E disse o Senhor a Satanás: Observaste o meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desvia do mal, e que ainda retém a sua sinceridade, havendo-me tu incitado contra ele, para o consumir sem causa” (Jó 2.3). A sinceridade de Jó era tão única que até a esposa dele se incomodou, como descrito em Jó 2.9: “Então sua mulher lhe disse: Ainda reténs a tua sinceridade? Amaldiçoa a Deus, e morre.”

Jó não se alterou mesmo cara a cara com conflitos e passando por diversas situações difíceis e por inúmeras perdas. “Ele não se corrompeu, não se voltou contra Deus, não perdeu a Fé, mas se manteve temente tanto quanto antes, quando ele tinha tudo. Ou seja, Jó reteve a sua sinceridade e mostrou que o que ele era e a sua conduta não eram influenciados pelas bênçãos, como muitas pessoas fazem”, disse o Bispo Renato durante uma reunião da Noite da Alma. Com base nessa história, o Bispo questionou a todos: “você é uma pessoa boazinha só enquanto as coisas estão indo bem para você?”

Aos que desejam abandonar a vida atrelada à mentira, o primeiro passo é encarar a verdade sobre si mesmo. “A sinceridade, segundo Deus, inclui não apenas uma admissão do que você faz, uma transparência, mas um reconhecimento de que você está errado e precisa mudar. Essa sinceridade leva a Deus e ao arrependimento”, destacou o Bispo.

A DONA DA RAZÃO
Há quem use a sinceridade como carta branca para dizer o que pensa sem se importar com quem está ouvindo. Vale ressaltar que há um abismo colossal entre sinceridade e sincericídio, que, muitas vezes, leva a pesssoa a ser ofensiva. Aos que disparam o que querem com o álibi de ser uma pessoa verdadeira, a Bíblia orienta que é bom ser tardio em falar (Tiago 1.19) e que “até o tolo quando se cala” é considerado sábio (Provérbios 17.28).

Também há aqueles que falam sem pensar e sem terem o menor pudor em admitir, muitas vezes, suas falhas e seus pecados.

A cabeleireira Simone de Almeida Rocha, (foto abaixo) de 37 anos, relata que foi apresentada ao engano desde cedo. Ela, que se via “amarga e cheia de ódio”, como menciona, diz que fazia tudo errado, mas que tinha uma boa desculpa para cada uma de suas atitudes.

“Sempre vinha em meu pensamento que eu tinha razão de estar fazendo aquilo”, reforça. Foi ainda pequena que ela ouviu que os homens não prestavam: “em casa, minha mãe estava no terceiro relacionamento, com sete filhos, e minhas irmãs não davam certo em nenhum relacionamento e, por isso, acabavam sozinhas e mães solteiras. Uma delas dizia ter sido violentada por meu próprio pai e, então, prometi a mim mesma que nenhum homem me faria sofrer e que, antes que ele fizesse algo comigo, eu faria primeiro com ele”, recorda.

Aos 15 anos, Simone perdeu sua mãe e foi obrigada a conviver com seu pai. “Comecei a desejar a morte dele e tentei matá-lo três vezes. Uma foi com uma faca que ele guardava como objeto de estimação; a segunda foi com uma enxada e a última foi com uma arma, mas não deram certo”, descreve.

Com a mesma idade, Simone teve o primeiro relacionamento.

Um ano depois, aos 16 anos, teve um filho e, aos 21, já era mãe de três. Os anos passaram e os problemas se intensificaram. “Em razão de muitas brigas, decidi me separar e entrei em outro relacionamento. Aos 28 anos, tive mais uma filha e, como eu me achava a dona da razão que poderia fazer o que eu bem quisesse. Mais uma vez, então, decidi me separar e afundei nas bebidas, no cigarro e na prostituição.”

Para muitas pessoas, lidar com a sinceridade é relativamente mais fácil do que lidar com o próprio orgulho. Para outras, porém, os dois casos se tornam um desafio, como foi para Simone. “Eu manipulava as pessoas. Me lembro que certa vez menti que iria trabalhar, mas, na verdade, saí com uma pessoa.

Em outra ocasião, um conhecido me viu no carro com outra pessoa, contou o que viu ao meu esposo na época e, por conta disso, houve uma confusão horrível. Mesmo assim, eu era muito orgulhosa e, quando surgiam os pensamentos que eu deveria pedir desculpas a quem eu tinha feito mal, logo pensava que se fizesse isso estaria me humilhando. Então, eu preferia nunca pedir desculpas e muito menos perdão.”

Aos 31 anos, Simone se casou com o açougueiro Mateus França Gomes. Segundo ela, os primeiros três meses foram bons, mas, depois, ela usava qualquer atitude mentirosa da parte dele como motivo para humilhá-lo. Ou seja, ela esperava sinceridade dos outros, mas não a exigia de si mesma. “Ele sofreu muito. Eu tinha um bando de ex-namorados de ‘reserva’ e ele tinha que aceitar que eles viessem na minha casa.”

A ficha de Simone caiu quando ela percebeu que esse relacionamento estava à beira do precipício. Foi quando ela chegou à Universal, há quase três anos. Simone relata como foi esse momento: “já estávamos dormindo separados e o vi ajoelhado, orando. Ali, parei para pensar por que eu era daquele jeito. Até minha filha tinha medo de mim. Eu queria ir até ele e pedir desculpa, mas não conseguia. No dia seguinte, ele falou que conhecia um lugar que tinha uma solução para o nosso caso e era a Universal. Fomos e, em uma reunião, percebi que tudo que eu fazia com as pessoas estava errado. Fui sincera com Deus e entendi que tinha que fazer o que era certo e não a minha vontade.” Hoje, Simone vive uma vida de sinceridade com seu esposo e suas filhas. “Tudo mudou na minha vida e na minha família”, garante.

FELIZES, MAS NAS REDES SOCIAIS
O médico Gerardo Roca Pérez, de 41 anos, é casado há nove anos com a engenheira de alimentos Georgina Alub Bejarano, (foto abaixo) de 33 anos. Ele lembra como foi sua infância: “meus pais estavam separados desde meu nascimento, fui criado pela minha mãe e meu padrasto e, depois, por meu pai e minha madrasta e mais dez irmãos. Passei minha infância em Guayaramerín, uma pequena cidade no interior da Bolívia que faz fronteira com o Estado de Rondônia. Meu pai era o prefeito da cidade e sempre fui uma criança tímida, mas com muitos amigos”.

Ele relata como se comportava na juventude, antes de conhecer Georgina: “meus relacionamentos sempre foram passageiros. Eu não queria nada sério com ninguém. Depois de viver vários deles, cheguei à faculdade de medicina e ali a vaidade dominava minha vida. Eu tinha que ser melhor em tudo e do que todos. Isso me levou a uma posição de liderança que aumentava ainda mais o meu ego”.

Foi vivendo assim que ele conheceu Georgina e a namorou por cinco anos praticamente a distância. Depois de várias separações, ele a pediu em casamento, apesar de tê-la traído. Já casados, esse problema persistiu. “Na cidade onde eu morava, as traições por parte dos homens eram vistas como normais. Cresci vendo meu pai (o também médico Guido Roca Villavicencio, de 69 anos) e meus tios tendo mulheres fora do casamento. Em reuniões de homens, o assunto sempre era com quem conseguiram ficar na última festa. Quando minha esposa descobriu e falou para a mãe dela que eu a tinha traído, ela falou: ‘filha, aguenta um pouco, pois ele é muito novo e depois vai perder essa vontade de ficar traindo’. Eu até enxergava nas traições um problema, mas não me acusava por fazer isso. Eu era mau-caráter e, para disfarçar, eu tinha que mentir sempre”, revela.

Georgina explica por que se sujeitava às traições depois que as descobria: “meus pais têm 36 anos de casados e, na minha cidade, a família é muito valorizada. Assim, muitas mulheres da minha família se sujeitavam a traições e aos vícios dos maridos”. Só que, por agir assim, ela se tornou uma pessoa insegura: “eu me sentia inferior a outras mulheres, não achava que tinha valor e até tive depressão. Eu sabia que tinha feito uma má escolha na vida amorosa, porque eu soube das traições durante o namoro, mas achava que ao nos casarmos ele mudaria”. Depois que se mudaram para São Paulo, o problema continuou: “eu vivia de aparência. Sempre postava fotos nas redes sociais porque queria mostrar o quanto eu estava feliz e realizada ou quanto eu era bem casada, mas, na realidade, estávamos há dias sem nos falar e dormindo de costas um para o outro. Ou seja, estávamos rindo para as câmaras, mas sem olhar um para o outro dentro de casa. Não tínhamos diálogo, companheirismo nem fidelidade. Não tínhamos casamento”, diz.

Foi nessa situação que o casal conheceu o Templo de Salomão, em outubro de 2014, como relembra Gerardo: “em uma viagem para a Bolívia, minha esposa ganhou um exemplar do livro Casamento Blindado, em espanhol. Um dia, indo para uma confraternização com amigos, o GPS do carro traçou um percurso errado e nos fez passar em frente ao Templo de Salomão. Então, ela falou que queria conhecer o lugar e fomos no dia seguinte. Lá, vi que precisava de ajuda e, em seguida, confessei para ela tudo que tinha feito, decidi me afastar de tudo o que lembrava meu passado e foquei em fazer o que era justo”, declara Gerardo. Ele assegura que a sinceridade passou a ser priorizada e que colhe os bons frutos disso: “hoje, o nosso casamento é prioridade depois do nosso relacionamento com Deus. Somos parceiros e unidos”.

CRENTE “RAIMUNDO”
Por 12 anos, a vida do lojista Leandro dos Santos Cardoso, (foto abaixo) de 31 anos, foi uma peça teatral, apesar de frequentar a Universal por 15 anos. “Eu morava em Santarém, no Pará, e, em 2007, minha família se mudou para Manaus, capital do Amazonas. Cheguei à Universal nesse ano, por meio de minha tia”, diz. Envolvido na Obra de Deus, Leandro lidava com responsabilidades. “Eu participava do projeto de esportes, da Força Jovem Universal (FJU), e auxiliava o coordenador estadual. Eu também procurava evangelizar, ajudar as pessoas, dar conselhos e isso me motivava e me deixava feliz”, conta.

No entanto a vida de Leandro era uma farsa. “Até eu mesmo me enganava e achava que estava bem espiritualmente, o que estava longe de ser verdade. Eu queria mostrar aos outros que era um homem de Deus: era a casca em que eu vivia. Eu era o famoso ‘crente Raimundo’: um pé na Igreja e outro no mundo. Na Igreja, eu era um santo, mas, da porta para fora, falava palavrões e besteiras, me envolvia com prostituição e pornografia, ia a festas, mentia para os meus pais que eu ia para aniversários quando, na verdade, ia dormir com alguma mulher. Durante a semana, eu me relacionava com duas, três, quatro mulheres. Eu mentia tanto que acreditava na minha própria mentira.”

Infelizmente, o que ele conta que fazia é a mesma realidade de muitos que estão na Igreja: “para manter o meu disfarce, eu me aproximava de obreiros, líderes, pastores e pessoas firmes na Fé. No fundo, eu era uma pessoa enganadora, solitária e triste”.
Leandro revela como entendeu que precisava agir de modo diferente: “minha ficha só caiu no início da pandemia de Covid-19, em 2020, quando fechou tudo. Certa noite, falei com Deus, só que não fui eu quem gritou por socorro, mas minha alma. Ali, me apresentei a Ele com sinceridade e humildade. Fui sincero ao reconhecer que vivia na mentira e procurei ajuda espiritual”.

Ele compreende hoje o que lhe faltava: “reconheço que eu não tinha o Espírito Santo, porque eu fazia tudo ao contrário do que orientava as pessoas. Então, o maior milagre que agora tenho na minha vida não é financeiro, familiar ou na saúde, mas é ter recebido o Espírito Santo, pois quem O tem não precisa de disfarce. Ele testifica o Próprio Deus para as pessoas, que veem essa mudança.

Leandro testemunha como ser uma pessoa sincera o tornou realmente melhor: “sou outra pessoa, pois meu modo de agir, de falar, de me comportar e de pensar mudou. Tenho paz e estou como obreiro ganhando almas e realmente ajudando as pessoas”, conclui.

SEM CERA
Duas associações são feitas em relação à origem da palavra sincero. Uma diz que ela vem do latim sincerus, junção das palavras sim (um só) com cerus (que cresce, se desenvolve), que dá a ideia de algo que cresce sempre da mesma forma, sem impurezas e surpresas desagradáveis. Também se atribui sua origem aos romanos que, na fabricação de vasos, usavam cera nas esculturas que eram imperfeitas. Dessa forma, “sine cera” quer dizer “sem cera”, o que dá a conotação de um vaso perfeito. Com o decorrer do tempo, se tornou a palavra sincero e passou a ter seu significado atrelado ao caráter humano verdadeiro, leal
e sem disfarces.

Durante uma meditação, o Bispo Edir Macedo disse que o coração perfeito surge da sinceridade. “Assim como o oleiro, Deus sabe quem somos: existem aqueles que são vasos de barro perfeitos, que não apresentam rachaduras. Quer dizer, não precisam de cera para cobrir defeitos e imperfeições, eles são transparentes.”

Vale ressaltar que todos podemos ter esse coração perfeito, mesmo sendo cercados por falhas e erros, a exemplo de Davi, que, conforme observou o Bispo Macedo, “cometeu um pecado gravíssimo e, mesmo assim, achou arrependimento aos olhos de Deus”. Portanto siga essa recomendação dele: “avalie a sua vida e o seu coração. Davi não procurava fingir ou ser dissimulado. Ele tinha um coração segundo o coração de Deus”.

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Colaborador

Flavia Francellino Fotos: Getty images, Demetrio Koch e Mídia FJU/Amazonas