Futuro comprometido: os impactos da evasão escolar

Muito mais do que a vida profissional, a baixa escolaridade influencia a autoestima, o desenvolvimento e até a saúde de uma pessoa

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O abandono dos estudos continua sendo um desafio no Brasil e precisa ser enfrentado com urgência para quebrar o ciclo de pobreza que se perpetua por gerações no País. Segundo os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2023 cerca de 400 mil crianças e adolescentes de 6 a 14 anos não estavam na escola – um recorde negativo. Além disso, mais de 9 milhões de jovens, entre 15 e 29 anos de idade, tinham abandonado os estudos. A faixa etária em situação mais preocupante é a de 18 a 24 anos, na qual 4,5 milhões abriram mão do diploma do ensino médio.

A necessidade de trabalhar foi apontada pelo levantamento como o principal motivo dos homens abandonarem os estudos. No caso das mulheres, a gravidez foi a principal razão para deixar a escola, seguida pelo trabalho doméstico. A princípio, essas justificativas são consideradas até válidas, afinal como priorizar os estudos quando é preciso colocar comida na mesa, por exemplo? No entanto o preço pago por essa troca tem impactos a longo prazo que podem mudar completamente o rumo da vida de uma pessoa.

Segundo a pedagoga Sônia Regina Gomes Bianco, além das questões financeiras, outros fatores influenciam na desistência de um estudante, como o bullying. Caracterizado pela prática de atos de violência física ou psicológica intencionais e repetitivos contra um indivíduo, as denúncias de bullying tiveram aumento de 67% em 2024, em relação ao ano anterior, segundo o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. “É preciso considerar ainda questões como falta de apoio familiar, baixa qualidade da educação e a dificuldade de aprendizagem”, pontua Sônia Regina.

Tendo em vista que o abandono escolar entre os jovens de famílias mais pobres é predominante, é possível concluir que a falta de perspectiva também é um fator que influencia a visão do estudante. Sem exemplos próximos de ascensão por meio da educação, muitos não enxergam valor nos estudos, especialmente em locais onde o trabalho braçal predomina.

Futuro comprometido

O abandono escolar tem impacto imediato na vida pessoal da criança e do adolescente, privando-os da oportunidade de desenvolver habilidades cognitivas, sociais e emocionais essenciais para o seu crescimento. Além disso, a escola desempenha um papel fundamental na socialização e sua ausência pode resultar em isolamento, frustração e baixa autoestima, aumentando a vulnerabilidade a situações de risco, como o envolvimento com drogas. “As crianças fora da escola acabam ficando mais expostas ao trabalho infantil, à exploração e ao aliciamento pelo crime”, destaca Sônia Regina.

A médio e longo prazo, a falta de instrução reflete na vida profissional. O mercado de trabalho tem sido cada vez mais exigente e aqueles que não finalizaram os estudos têm mais chances de ficar desempregados ou atuar na informalidade, ou seja, não ter os direitos trabalhistas determinados por lei. Consequentemente, os salários oferecidos serão menores e a dificuldade financeira se manterá em casa. “Sem mão de obra qualificada, até a economia do país fica enfraquecida, sem contar o aumento da desigualdade e da criminalidade.”

Vale a pena citar ainda as descobertas recentes de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul que revelaram que a falta de acesso à educação é o maior fator de risco para declínio cognitivo no Brasil, ficando acima de fatores como idade ou sexo do paciente. Segundo os especialistas, o estudo contínuo fortalece o cérebro e reduz esse risco.

Virando a página

Para Sônia Regina, não existe um único responsável pelo atual cenário da educação, assim como não há uma solução simples a ser adotada: “A evasão escolar não é um problema educacional, mas uma questão social. Resolvê-la exige ação conjunta do governo, da escola, da família e da sociedade. Enquanto os pais devem incentivar, a escola precisa acolher e o poder público deve garantir estrutura e políticas de permanência.”

Atualmente, a aposta do governo federal é o Programa Pé-de-Meia, que oferece um incentivo financeiro mensal de R$ 200 para os estudantes de baixa renda que mantiverem frequência nas aulas, além de R$ 1 mil ao final de cada ano concluído. A iniciativa é importante, mas precisa ser integrada a um conjunto de medidas que envolvam melhorar a infraestrutura escolar, incentivar a formação de professores, tornar as aulas mais atrativas e encorajar o aprendizado real, capaz de promover mudança de patamar. Afinal, não é só ter um diploma, mas alcançar o conhecimento que a escola proporciona. Só assim será possível que o futuro seja mais promissor tanto para os jovens como para o Brasil.

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Colaborador

Cinthia Cardoso / Fotos: Five Buck Photos e timeless/getty images