Dinheiro não pode comprar a verdade, mas pode fabricá-la

O produto dos noticiários não é a notícia, mas a sua atenção e para obtê-la vale tudo, inclusive criar uma “verdade paralela”

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Na batalha pela sua atenção, a regra é “quanto pior, melhor”. Tragédias “vendem” e explorar a curiosidade mórbida do ser humano é o primeiro passo para fazer da indústria da notícia um negócio altamente lucrativo. Porém, mais do que notícias ruins, o que realmente traz lucro é o dinheiro dos grandes patrocinadores.

Em qualquer site de notícias, o espaço publicitário é bem maior e mais chamativo do que o das notícias em si. A publicidade tem invadido as matérias de tal forma que apenas uma pequena parcela das pessoas as lê até o fim e se dá conta de que a manchete é tendenciosa e de que o texto foi manipulado para transmitir uma ideia que nada tem a ver com os fatos. A maioria apenas lê a manchete, sai repetindo e ajuda a difundir as “fake news” – e de graça!

Dentre os grandes anunciantes que bancam redações de Norte a Sul do Brasil, o governo se destaca e dá o tom do que será dito a seu próprio respeito. Não é por acaso que atualmente, ao ler as notícias sobre política e economia, o leitor seja induzido a achar que o país está melhor do que nunca.

Não há mais nenhum “Nero” incendiando a Amazônia, embora o nível das queimadas tenha aumentado drasticamente. Dados do Monitor do Fogo do MapBiomas registraram aumento de 248% das queimadas em janeiro de 2024, em relação ao mesmo período do ano passado. A Amazônia foi o bioma que mais queimou, somando mais de 1 milhão de hectares, como se metade do Estado de Sergipe tivesse sido queimado em apenas um mês. Mas onde está a grande mídia e os atores de Hollywood? Onde estão os artistas brasileiros cantando “Salve a Amazônia” com cara de enterro?

Não importa mais que a inflação esteja subindo, que os preços de muitos artigos de primeira necessidade – incluindo medicamentos – estejam mais altos do que na época da pandemia, que impostos que haviam sido suspensos estejam voltando com força total e que os investimentos nas áreas da educação e saúde tenham sido reduzidos drasticamente.

De uma só vez, o governo Lula cortou R$ 4 bilhões de programas de bolsas de estudo, da educação básica e da Farmácia Popular, mas, em vez de lutar para manter a verba, o Ministério da Saúde está tranquilo e afirma que os cortes “não impactarão no planejamento de imediato”, como se o futuro não importasse. Onde está o alarde da imprensa?

Não importa que a dengue tenha batido recorde de vítimas fatais neste ano, nem que mortes de yanomamis cresceram mais de 6% no atual governo. E ninguém parece ligar para o escandaloso fato de que o governo Lula causou o maior rombo da história nas contas públicas. Por que tanto silêncio diante de tantas barbaridades? Seria por já terem conseguido o que tanto queriam?

A verba de mídia do grupo de comunicação que ainda controla a mente de grande parte das pessoas deste país aumentou em 60%, chegando, apenas em 2023, a incríveis R$ 142 milhões. Remédio, tratamento, educação e qualquer outra coisa que realmente beneficie a população são irrelevantes diante do poder das narrativas que a mídia pode incutir na mente do leitor, telespectador e, por fim, eleitor. O que importa mesmo é que a maioria dos brasileiros vota com o coração, não com a cabeça e isso precisa ser mantido a todo custo.

O que está valendo é a regra do “quem pode mais, chora menos”. Logo, como a população pode menos, chorará muito mais. Mas console-se, caro leitor e eleitor, e lembre-se sempre de que o amor custa caro.

* Por Patricia Lages, jornalista

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Colaborador

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