Armadilhas nas redes sociais
Influencers incentivam “desafios” que estão levando crianças à morte. O que fazer?
As crianças nunca estiveram tão expostas quanto nos dias de hoje. Mas, se antes o perigo estava nas ruas, agora ele está ao alcance das mãos dentro de casa. Para ser mais exato: na tela do celular.
O primeiro contato com as telas costuma ser inofensivo e acontece em joguinhos usados como distração. Aos poucos, porém, a ideia de diversão se transforma e a criança e o adolescente se aprofundam no mundo virtual. Com isso, eles passam a ter interações que envolvem desconhecidos e, muitas vezes, bem diante dos olhos dos pais, acabam mergulhando em ambientes que oferecem riscos sérios e reais.
Parece exagero, mas não é. Neste ano, duas meninas morreram depois que participaram de “desafios” divulgados nas redes sociais. Em abril, Sarah Raíssa de Castro, de 8 anos, morreu após inalar desodorante aerossol. Um mês antes, outra criança, de 11 anos, faleceu pelo mesmo motivo. Infelizmente, essas tragédias não são novidade, pois já tem um bom tempo que desafios como esse fazem inúmeras vítimas no Brasil e mundo afora.
Conteúdo que envolve
Os desafios, muitas vezes disfarçados de brincadeiras ou testes de coragem, são na verdade práticas arriscadas e degradantes, que colocam em risco a integridade física e emocional dos participantes. Crianças e adolescentes, movidos pela curiosidade e influenciados por criadores de conteúdo, se envolvem em desafios sem ter plena noção das consequências.
A psicóloga Joana d’Arc Sakai explica alguns aspectos que os fazem agir dessa maneira: “As crianças não têm maturidade para refletir sobre aquilo que está sendo proposto. Somado a isso, podemos citar outros fatores que levam à sujeição a situações autodestrutivas, como a busca por pertencimento, a necessidade de aceitação, de afirmação social, de popularidade e de uma identidade de coragem”.
Joana d’Arc alerta que essa necessidade de se expor e de provar o próprio valor modifica o comportamento da criança e do adolescente e deixa uma recomendação aos pais: “Quando perceber que seu filho mudou drasticamente de comportamento, está se isolando, demonstra alterações no sono, no apetite e no humor ou uma queda significativa de rendimento escolar, é porque algo não está bem com ele e ele precisa de ajuda”.
Papel familiar
Apesar da correria do dia a dia, os pais precisam ter consciência de que os filhos precisam de atenção e de ensinamentos que só serão absorvidos se a família passar um tempo de qualidade junta. “Estar presente é muito mais do que simplesmente dividir o mesmo espaço, significa dedicar tempo de qualidade, especialmente em atividades offline. Gincanas, piqueniques, visitas a museus ou qualquer experiência que fortaleça o vínculo familiar são formas valiosas de conexão e cuidado. Se mostrar interessado pelo filho também trabalha a autoestima e o valor próprio, deixando-o menos vulnerável a aceitar propostas apenas para se incluir”, diz Joana d’Arc.
Ela lembra que o diálogo é o primeiro passo para proteger os pequenos dos perigos on-line. Nessa conversa com eles devem abordar os riscos do mundo on-line da mesma forma que os orientam a não conversar com estranhos na rua ou a não colocar a mão no fogo. “Assim, a criança vai sendo formada para ter um pensamento crítico em relação às suas atitudes e ao que ela aceita receber do outro”, esclarece Joana d’Arc.
Além de dar orientações, os pais desempenham um papel fundamental no monitoramento da vida digital dos filhos. É essencial que acompanhem o histórico de navegação, identifiquem os sites visitados e as pessoas com quem eles interagem e o conteúdo que compartilham. Esse cuidado ajuda a detectar o acesso a conteúdos nocivos e também a identificar possíveis ameaças, como a ação de pedófilos e outros criminosos que usam as redes para atrair suas vítimas.
Joana d’Arc ensina ainda o que os pais podem fazer ao identificar que os filhos estão tendo contato com conteúdos inadequados ou mesmo se submetendo a desafios: “É importante acolher, em vez de julgar, criticar ou punir. Se os pais chegarem ao filho com agressividade ou autoritarismo, o resultado pode não ser bom. Um caminho interessante é perguntar a eles: O que o atraiu nesse conteúdo? O que você pensa sobre isso? Quais são os riscos que você observa nesta postagem? Como você se sente em relação a isso? Ou seja, levá-lo a pensar e oferecer uma educação digital crítica, mas com parceria”.
Menos curtidas e mais experiências
As crianças e os adolescentes de hoje nasceram no meio da revolução digital, mas precisam conhecer o mundo real. Sair das redes sociais traz uma nova perspectiva para o ser humano, que passa a se comparar menos, a exigir menos perfeição de si mesmo e a necessitar de menos aceitação da parte do próximo.