Emoção é a arma secreta da manipulação: entenda a Teoria do Enquadramento
Responda rápido em qual destas duas propostas você apostaria R$ 5:
- A que oferece 90% de chance de perder R$ 5 e 10% de chance de ganhar R$ 95;
- A que oferece 10% de chance de ganhar R$ 100 e 90% de chance de não ganhar nada.
Segundo Daniel Kahneman, autor do livro Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar, provavelmente você escolheu a segunda. Isso acontece por dois motivos: o primeiro é porque, quando respondemos rapidamente, não damos ao cérebro o tempo necessário para perceber que as duas propostas são idênticas. O segundo é porque é mais aceitável dizer que não ganhamos nada do que dizer que perdemos R$ 5.
Essa é a Teoria do Enquadramento, que nos leva a ter crenças e preferências diferentes em relação às mesmas situações, sem que as informações sejam falsas, apenas apresentadas de formas diferentes. O próximo exemplo deixará tudo ainda mais claro.
O poder do enquadramento na prática
Quando o Código de Defesa do Consumidor autorizou o comércio a cobrar taxas conforme o meio de pagamento (Lei nº 13.455/2017), desde que a diferenciação seja informada de maneira clara, lojistas de todo o País adotaram duas estratégias:
- Manter todos os preços e colocar cartazes informando o acréscimo de 5% nos pagamentos com cartão de crédito;
- Aumentar todos os preços em 5% e colocar cartazes informando o desconto de 5% nos pagamentos a vista.
Embora as duas estratégias levassem exatamente ao mesmo resultado – e os lojistas não estivessem mentindo –, os que escolheram a primeira opção tiveram de lidar com clientes irritados, muito bate-boca e desistências de compra. Já os que implementaram a segunda opção agradaram os clientes oferecendo um desconto que, na prática, era apenas uma mudança de enquadramento.
Levou tempo para que o consumidor percebesse que se tratava da mesma coisa – até porque a disparidade de preços no Brasil pode ser enorme –, mas, até que isso ocorresse, o hábito já estava estabelecido.
O jogo dos sistemas mentais: por que reagimos assim?
De acordo com Kahneman, temos dois sistemas mentais: o sistema 1, que é rápido, automático, intuitivo e emocional; e o sistema 2, que é lento, deliberado, lógico e analítico. A Teoria do Enquadramento atua sobre o sistema 1, influenciando a emoção e o instinto antes que a razão e a lógica entrem em cena.
Com o advento da internet, e principalmente das redes sociais, grande parte das pessoas se acostumou a julgar tão rápido que raramente percebe a manipulação de informações à qual todos estamos expostos.
Em Rápido e Devagar, Kahneman afirma que o enquadramento pode ocorrer em qualquer tipo de comunicação pública: na política, no jornalismo, na publicidade e nas redes sociais. É uma forma sutil, mas muito poderosa, de moldar percepções sem mentir, apenas mudando o foco e o tom.
Nosso cuidado com as informações deve ir além da caça às fake news. Se não quisermos ser manipulados, precisamos ativar o sistema 2, investindo tempo para chegar a conclusões lógicas e racionais.
Neste tempo de inteligência artificial, é fundamental lembrar que o cérebro humano não pode se tornar obsoleto. É preciso usá-lo mais do que nunca.
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