Vício: o destruidor de sonhos

A dependência de drogas, álcool e jogos, entre outras, escraviza o indivíduo e tira dele a paz e as perspectivas de viver um futuro diferente

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Olhar vazio, pessoas  sem rumo e quase nenhuma condição de sobrevivência. Essas são as características visíveis dos dependentes químicos que vivem na Cracolândia, no centro de São Paulo. A região já foi conhecida como um dos pontos mais nobres da cidade e é repleta de comércios, atrações culturais, grandes empresas e a famosa Estação da Luz. No entanto o local perdeu a própria identidade com a chegada do crack, como ocorreu com os usuários que perambulam por ele. A droga consome a vida dos dependentes e eles abandonam família, casa e trabalho para viver pelas ruas em busca de mais uma “pedra”.

Uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) divulgada no início deste ano mostrou que 73% dos moradores da Cracolândia viviam com a família antes de ir parar nas ruas. O grupo é constituído de homens (73,8%), pessoas solteiras (75,8%) e indivíduos de cor parda (47,7%). Outro dado que chama a atenção é que 39% dos dependentes químicos afirmaram que frequentam o local há mais de dez anos e 18% o frequentam há pelo menos cinco anos.

Variedade de entorpecentes 

O crack ganhou notoriedade por causa do rápido efeito viciante e grande potencial destrutivo, mas não é o único entorpecente que faz vítimas mundo afora. A anfetamina, por exemplo, era um fármaco usado para o tratamento de depressão e asma, mas passou a ser usado como estimulante e descobriu-se seu potencial viciante, reforçado depois pela metanfetamina. Além da evidente perda de peso, o usuário pode ter crises psicóticas, queda dos dentes e danos no nariz e na boca.

Outro grupo de entorpecentes que vem ganhando destaque, em especial nos Estados Unidos, é o dos opioides, como a heroína e o fentanil. Este último inclusive teria sido responsável por 75 mil mortes por overdose em 2022. Existem ainda a cocaína e o LSD, que levam os usuários à condição de psicose e prejudicam a saúde, pois causam danos como aumento de pressão arterial, risco cardíaco e euforia. No caso do LSD, as alucinações podem levar o usuário a se colocar em situação de risco, como querer pular de uma janela, por exemplo.

Já o álcool e a nicotina são drogas lícitas no Brasil, o que não elimina seu poder viciante e destrutivo. Vale a pena destacar o grande apelo que os fabricantes desses produtos fazem para alcançar um público cada vez mais jovem. Apesar de proibidos no Brasil, os cigarros eletrônicos viraram moda entre os adolescentes, assim como o narguilé. Em razão do sabor e do cheiro agradáveis, muitos pensam que os prejuízos que eles geram são menores do que os causados pelo cigarro tradicional, por exemplo.

Outra droga que ilude muitas pessoas com o mesmo discurso de ter poucas consequências é a maconha. Além da dependência, o consumo do THC (princípio ativo do entorpecente) pode levar à redução da capacidade de aprendizagem e raciocínio, principalmente em jovens.

Ineficiência no combate

Esse breve panorama deixou claro que as drogas são uma questão de saúde pública, mas há uma série de divergências quanto à  forma de combatê-las. No Brasil, por exemplo, a descriminalização da maconha está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). Se for aprovada, será legalizado o porte de determinada quantidade do entorpecente, mas será que há uma real intenção de combater o uso da droga?

Do ponto de vista prático, a descriminalização ignora todos os danos físicos provocados pela droga, seu potencial de levar ao uso de outros tóxicos e o estímulo ao tráfico, afinal, onde o entorpecente seria adquirido? É ingenuidade acreditar que toda a droga consumida viria do cultivo pessoal.

Experiências internacionais mostram que a descriminalização pode esvaziar as prisões, mas não funciona como política de combate às drogas. Portugal, por exemplo, tem repensado suas escolhas do passado. Em 2001, o país descriminalizou o uso de drogas, como maconha, cocaína e heroína. Apesar do consumo e a posse de entorpecentes ainda serem proibidos, ninguém recebe punição por essas atitudes. Os usuários que as usam exageradamente são registrados pela polícia e encaminhados a tratamentos, que são opcionais. Os resultados são aumento de 12,8% no consumo, maior número de overdoses e um salto de 14% na criminalidade.

No Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, a grande tolerância com delitos e uso de drogas elevou a criminalidade e o número de dependentes químicos e de moradores de rua. Na cidade de São Francisco, por exemplo, cerca de 9 mil pessoas vivem ao relento. Estima-se que esse fato resulte de uma lei aprovada em 2011 pela Suprema Corte que, para reduzir a população carcerária, retirou as penas de prisão de quem porta determinada quantidade de drogas e rouba ou furta até US$ 400. Hoje a legislação vale só para o condado de Los Angeles, mas o valor de tolerância foi reajustado para US$ 950 (o equivalente a R$ 4,6 mil).

“O Brasil sempre foi um grande seguidor cultural dos Estados Unidos, ou seja, o que acontece lá depois vem para cá. Neste ponto, eu creio que o Brasil pode aprender com o que não está funcionando. Esta liberdade indiscriminada não tem funcionado nem em um país que tem todas as condições como os Estados Unidos, que dirá aqui no Brasil. Muitas pessoas ouvem as palavras ‘progresso’ e ‘progressismo’ e pensam que só tem coisa boa. E, às vezes, o progresso é um retrocesso. Se você progride na direção errada, você está regredindo. Então, os Estados Unidos têm progredido na direção errada, o que tem causado um grande retrocesso social, familiar e até financeiro, que já está começando a acontecer lá também”, disse o Bispo Renato Cardoso, em entrevista ao Domingo Espetacular, na Record TV. A reportagem exibiu ainda o trabalho dos voluntários da Universal no Estado norte-americano.

Muito além da saúde

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a dependência química é uma doença crônica, progressiva e que pode ser fatal. Sem dúvida, um dos primeiros impactos é na saúde. Porém há outros prejuízos àqueles que se rendem ao uso de drogas, como problemas familiares, profissionais e emocionais. “A dependência causa depressão, perda da autoestima, da dignidade, dos princípios, perdas materiais e, muitas vezes, até da vida”, diz o Bispo Nilton Patricio, responsável pelo Tratamento para Cura dos Vícios, mantido pela Universal.

Ele explica que o vício não está ligado a um entorpecente ou uma atitude que gera prazer ao indivíduo, mas “há uma força maior por trás dessa situação, que é o ‘espírito de vício’ que domina a pessoa”. Por isso, são muitos os casos daqueles que até querem parar de consumir drogas e tentam por conta própria, mas não conseguem. Outros recorrem a medicamentos, tratamentos e até internações, mas convivem com recaídas. “Esses tratamentos fazem a desintoxicação do corpo, porém o espírito do vício atua na mente do adicto [dependente]. Assim, a solução é a extração dessa força do vício”, orienta o Bispo Nilton.

A cura, segundo ele, acontece por meio de uma decisão de colocar um ponto final no vício e de obedecer ao que é ensinado na reunião. “Para sair definitivamente dessa condição é preciso assumir um compromisso com o Ser Supremo: o Senhor Jesus”, esclarece.

O vício e a depressão

O empresário Marcelo Sena Souza, (foto abaixo) de 34 anos, conheceu o Tratamento para Cura dos Vícios por meio de sua mãe, Jesuína, que frequentava a Universal. Ele conta que aceitou o convite para participar de uma reunião depois de chegar ao pior momento de sua vida.  “Eu tinha um grupo musical e tocávamos juntos havia dez anos. Quando saí do grupo, me deparei com a minha realidade: mergulhado na depressão e sem rumo. Aí vi que minha única saída seria Deus”, relembra.

Mas, antes de tomar essa decisão de buscar ajuda, Marcelo conviveu com diversos vícios. “A curiosidade me levou a fumar o primeiro cigarro aos 16 anos. Em seguida, comecei a beber e a usar maconha e outras drogas, principalmente em festas”, destaca. Porém o que era eventual começou a ganhar cada vez mais força, conforme descreve: “todos os dias eu tomava praticamente uma garrafa de vodca ou de uísque, fumava um maço de cigarro e consumia outros entorpecentes”.

Essa rotina durou cerca de 15 anos e trouxe uma série de danos. “Eu perdi bastante dinheiro, saúde e a paz. Também desenvolvi ansiedade e depressão. Tudo isso foi se intensificando com o vício. Costumo dizer que também perdi muitos anos da minha vida, pois não me lembro de grande parte dela. Eu vivia drogado ou bêbado”, comenta.

Apesar de sua guerra interior, em casa Marcelo contava com a fé de sua mãe. Ele sabia dos propósitos que eram feitos por ele e isso chamava sua atenção. A perseverança dela o fez ver a reunião do Tratamento para Cura dos Vícios como a única solução. “Quando eu estava no meu pior momento, fiz um desafio com Deus. De forma bem direta, eu disse que se Ele me ajudasse a sair daquela situação eu iria servi-Lo, porque senão eu iria me matar”, diz.

Decidido, Marcelo não mediu esforços para obedecer ao que vinha do Altar. “Logo no início, eu consegui deixar parte dos vícios por conta própria, mas não todos. Então, eu não aceitei  e fui sincero com Deus. Falei tudo o que eu ainda gostava de consumir e pedi a ajuda dEle, com a certeza de que Ele era o Único capaz de mudar a minha história. Depois desse dia, eu nunca mais usei nada”, recorda.

A cura foi acompanhada pela busca do verdadeiro encontro com Deus, o que culminou com sua transformação. “Faz cerca de cinco anos que estou livre de todos os tipos de vícios. Digo que houve um antes e um depois na minha vida. Deus me deu muito mais do que eu perdi: fui curado da depressão, dos vícios e da ansiedade, me casei com uma mulher de Deus e sou feliz de verdade”, diz.

A Palavra que transforma

A perda dos pais deu início à jornada de sofrimento de Fernanda Viana da Silva, (foto abaixo) de 29 anos, agente escolar. Aos 7 anos, ela foi acolhida por uma família, na qual encontrou uma mãe que a amava, mas um pai que logo a apresentou à bebida alcoólica. “Ele fumava e bebia muito e me ofereceu álcool quando eu tinha ainda 7 anos. Apesar de pequena, eu comecei a ser rebelde e a me embebedar. Naquela época, sofri um abuso e surgiu o desejo de suicídio”, revela.

Aos 14 anos, já envolvida com outras drogas, Fernanda já tinha passado pelo Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e sido atendida por psiquiatras e psicólogos. Todas as tentativas, porém, foram em vão. “Tomei remédios e passei por vários procedimentos, mas nada resolvia o meu problema. Na tentativa de me ajudar, minha mãe adotiva me levou à casa de espíritos, mas a situação piorou, porque eu ouvia vozes, via vultos e conheci a cocaína, o lança-perfume e a maconha. Para manter o vício, cheguei a me prostituir e ficava vários dias fora de casa”, conta.

Mergulhada em uma vida de destruição, a depressão se acentuou. “Tentei o suicídio sete vezes e em um episódio quebrei a minha casa inteira, me automutilei e deixei o gás do fogão escapando por 30 minutos. Nesse mesmo dia, ainda tentei matar a minha mãe e a minha filha”, relata.

Ela conta que, ao longo dos 17 anos em que foi viciada, todas as áreas de sua vida, como a saúde, a amorosa, a familiar e as finanças, tinham a marca do mal:. “tudo que eu ganhava era destinado aos vícios e eu ainda vendia minhas roupas, calçados e bolsas. Eu vivia em função das drogas”, afirma.

A chance de recomeçar surgiu quando sua mãe, Ednalva, conheceu a reunião do Tratamento para Cura dos Vícios e lhe fez um convite. “No começo, eu achava que conseguiria mudar sozinha, então não abri mão da minha vida velha. Eu ia à igreja para ter um alívio na alma, mas era algo temporário porque não havia uma decisão minha. Foi assim durante cinco anos, até que comecei a mudar, parei de usar drogas e achei até que tivesse recebido o Espírito Santo, mas me acomodei, deixei de sacrificar o meu eu e passei a desobedecer a Deus. Quando me dei conta, estava usando drogas novamente”, ressalta.

A recaída trouxe à tona não apenas os vícios, mas uma série de outros problemas. Fernanda foi até ameaçada de morte. “Fiquei seis meses longe da Presença de Deus e foi pior do que quando eu não O conhecia. Precisei chegar ao fundo do poço para reconhecer que precisava de ajuda. Então, eu apresentei a Deus tudo que eu estava sendo, me batizei nas águas de verdade e passei a obedecê-Lo de novo”, revela.

Fernanda conta que a transformação começou em sua mente e que hoje colhe os resultados das suas boas escolhas. “Fui curada da depressão e, por meio do batismo com o Espírito Santo,  passei a ter um rumo na minha vida. Existe diálogo dentro de casa, sou uma pessoa equilibrada e nasceu em mim o amor por minha família e também pelas pessoas que sofrem. Quem olha para mim hoje vê uma mulher transformada. Antes, eu vivia em função do vício e da minha vontade, mas hoje vivo para obedecer à Palavra de Deus”, finaliza.

Da rua para a fé

O auxiliar de serviços gerais Anderson Barboza de Luna, (foto abaixo) de 40 anos, cresceu em um lar desestruturado. “Quando eu era criança, eu via o meu pai agredir a minha mãe e depois de um tempo ele nos deixou, o que gerou em mim mágoa e rancor”, comenta. O tempo passou e a adolescência lhe trouxe descobertas. “Eu passei a sair à noite aos 14 anos e conheci o cigarro. Em seguida, passei a consumir bebida alcoólica. Pouco depois, eu já estava usando maconha, cocaína, crack e todos os tipos de drogas”, lista.

Os vícios acompanharam Anderson por 24 anos e os seus dias tinham a mesma rotina: “eu começava com a bebida, aí o meu corpo pedia mais adrenalina e eu usava outras coisas. Além disso, eu ainda era viciado em jogos”. Um ponto que ele destaca é que não tinha consciência de seus atos e arrumava brigas na rua: “quando eu era menor de idade, fiz minha família mudar de casa 18 vezes só na cidade de São Paulo e depois de adulto passei por seis Estados para fugir das pessoas que queriam me matar”.

A estabilidade não foi a única perda ao longo dos anos em que ele esteve escravizado pelos vícios, conforme destaca: “me separei e perdi tudo por causa dos vícios, como restaurante, carro e moto. Eu tinha uma tristeza que me acompanhava 24 horas por dia. Eu até trabalhava e tentava me preencher de alguma forma, mas não conseguia mudar. Eu vivia cercado por coisas erradas”.

Apesar do sofrimento, ele só recorreu a Deus quando todas as portas se fecharam para ele.  “Além do vício e de todas as perdas que acumulei ao longo da vida, eu ainda me envolvi com o crime e, quando eu já não tinha mais para onde ir, fui morar na rua”, diz. Foram exatamente 31 dias vivendo sem casa, porém a dificuldade fez com que ele desse uma oportunidade para a fé. “Eu conheci a Universal na infância, então decidi retornar, mas não foi fácil. No dia que eu tomei essa decisão, tive muitos pensamentos de morte e tentei me matar três vezes. Foi quando eu tive mais certeza de que só Deus poderia me ajudar”, argumenta.

Ao participar do Tratamento para Cura dos Vícios, Anderson entendeu que lutava contra um espírito e se entregou a Deus completamente. “Meu processo de libertação foi rápido e saí da primeira reunião livre, porque eu estava decidido.” Porém a cura dos vícios foi apenas o primeiro passo, conforme explica: “eu busquei o Espírito Santo e perseverei para recebê-Lo. Precisei entregar a vida que eu levava, a mágoa que carregava do meu pai e todo o meu passado para receber uma nova vida”.

Ele vive essa realidade há três anos. “Meu interior mudou completamente e isso influencia meu exterior. Hoje tenho paz, trabalho e ajudo aqueles que enfrentam o mesmo problema que eu passei. Com o Espírito Santo, eu tenho uma vida verdadeiramente completa”, encerra.

O primeiro passo 

Assim como o vício começa com a decisão de experimentar o entorpecente ou a bebida, por exemplo, a cura também depende dela. “O que ensinamos na reunião do Tratamento para Cura dos Vícios é que a pessoa precisa perseverar e não aceitar mais ser escrava dos vícios”, conta o Bispo Nilton Patricio. Esse passo, no entanto, deve ser acompanhado da obediência. Seguir a Palavra de Deus exige renúncia e dedicação. Em troca, o Criador age em favor da pessoa.

Sem internação, medicamentos e custos, o Tratamento, que já curou milhares de pessoas, atua no campo espiritual, arrancando pela raiz o mal que leva o indivíduo aos vícios. “O Tratamento será a última porta que você vai bater para se livrar de uma vez por todas desse mal e você será mais um dos inúmeros casos positivos que temos”, observa o Bispo.

Os familiares também podem buscar por seus entes queridos. “Ao participar, o familiar consegue ter clareza do que está por trás de toda a destruição e aprende a lidar com o viciado. Orientamos que ele traga uma peça de roupa, virada do avesso, com um nó, para representar o ente querido que está nos vícios. Dessa forma, ele será alcançado por meio da fé”, destaca o Bispo Nilton.

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Colaborador

Cinthia Cardoso / Fotos: Demetrio Koch, Casarsa/getty images e arquivo pessoal