Você aceita atos corruptos?

Corrupção é “o ato ou efeito de corromper-se” e, apesar dela ocorrer com maior destaque no âmbito político, também está presente no dia a dia de cada um de nós

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Corrupção. Essa palavra é bem conhecida. Ela está estampada em manchetes, é tema de debates e está impregnada no dia a dia de toda a sociedade em todo o mundo tanto por conta de ações de corrupção quanto por suas consequências. E, cá entre nós, quando falamos, pensamos e notamos a corrupção, geralmente, a relacionamos à política, não é mesmo? Mas ela não se restringe a essa área – infelizmente, a ultrapassa.

“A corrupção é um fenômeno complexo que envolve abuso de poder para ganho pessoal, seja financeiro, seja de outra natureza. Ela é muito mais do que a simples transgressão legal. É uma questão ética que mina a confiança nas instituições e prejudica o desenvolvimento e a justiça social”, diz o internacionalista Rodrigo Reis.

Em uma sociedade ideal, a corrupção seria completamente abolida e, consequentemente, a palavra seria esquecida. Contudo, ela persiste e todos sofremos quando faltam recursos públicos para a educação, saúde, segurança e qualquer outra área porque a verba foi desviada para a conta bancária de alguém, em vez de ser destinada a suprir as necessidades da cidade, do Estado e do país. Ela é fruto do desejo de alguém que quer “tirar uma casquinha” quando lhe convém.

Diferentes faces
Aliás, existem diferentes tipos de corrupção e Anderson Cruz, advogado e pesquisador social, aborda cada um deles:

“Corrupção ativa: referese ao ato de oferecer vantagens a alguém visando benefício próprio;

Corrupção passiva: relaciona-se ao funcionário público (ou colaborador, no âmbito empresarial) que aceita receber vantagens para si ou outros indivíduos em troca da adoção de atitudes corruptas;

Corrupção necessária: é quando um indivíduo recorre a atitudes corruptas com o intuito de agilizar processos e burlar a burocracia para obter um serviço autorizado pela lei. É chamada de necessária porque o fim é legal, ainda que os meios sejam ilícitos;

Corrupção preditiva: no setor público, ocorre quando um agente político é corrompido antes de ser eleito e, no âmbito empresarial, é quando um colaborador se vincula a grupos envolvidos com atos corruptos;

Corrupção lateral: ocorre quando um agente público cria bancadas ou blocos de ação com o objetivo único de votar em projetos em prol de seus interesses” .

Na política, é fácil identificar a corrupção, como o peculato (desvio de recursos públicos), caixa-dois, propina, fraudes em licitações para favorecer empresas privadas, nepotismo (favorecimento de familiares em posições de confiança dentro da esfera pública) e demais atos que visam vantagens ilegítimas diretas ou indiretas em forma de dinheiro, bens ou serviços.

Só que a corrupção não se limita à política. Você sabia que não emitir nota fiscal de um produto ou serviço, sonegar impostos ou tentar subornar um agente público para evitar multas são atos de corrupção? O mesmo vale para falsificar o documento de estudante ou um atestado médico, dar ou aceitar o troco errado, “colar” em exames acadêmicos, passar as pontuações da sua carteira de motorista para outro condutor indevidamente, usar as ferramentas do trabalho para benefício pessoal, etc. E tem mais: também é corrupção furar fila, comprar ou vender produtos falsificados, furtar água ou energia elétrica, usar um aparelho para liberar canais da operadora de TV por assinatura ou a conta de streaming de outra pessoa.

Apesar de parecerem inofensivas, essas ações só são consideradas “pequenas” porque nosso poder de influência é limitado. Se ele fosse maior, como o de políticos ou empresários, seriam atos corruptos capazes de afetar negativamente um número maior de pessoas. “A corrupção rompe o equilíbrio natural entre as pessoas, a integridade moral, a harmonia, a fraternidade, a legalidade e a igualdade de oportunidades”, diz Cruz.

Vamos mudar o “todo mundo faz”?
Infelizmente, caro leitor, é bem provável que você já tenha sido corrupto algumas vezes e ainda massageado sua consciência com o seguinte argumento: “todo mundo faz”. Mas já pensou como seria bom se todos fizessem o justo, o lícito, o moralmente aceitável? Parece utopia sonhar com um mundo menos corrupto e corruptível, mas não é impossível e essa mudança coletiva pode e deve começar com as atitudes individuais.

Para Reis, a classe política deve dar o exemplo com sua atuação, agindo com integridade, ética e transparência e, ainda, destinando o investimento em educação e cultura não apenas para o mercado de trabalho e desenvolvimento econômico.

Já Cruz afirma que “o trabalho da classe política deve ser também voltado para a cidadania e a conscientização da população quanto aos seus direitos, deveres e obrigações, além de educar e informar o público sobre a responsabilidade do governo em se livrar da corrupção”. Segundo ele, os políticos também não devem apenas criar e implementar leis anticorrupção robustas, mas terem uma conduta exemplar e se responsabilizarem por seus atos, uma vez que a legislação conta com diversos recursos que visam combater e criminalizar a corrupção. Podem ser citadas as leis Anticorrupção (12.846/2013), Cade ou Antitruste (12.529/2011), de Acesso à Informação (12.527/2011), Ficha Limpa (Lei Complementar 135/2010), de Improbidade Administrativa (8.429/1992, alterada pela Lei 14.230/2021), Lavagem de Dinheiro (9.613/1998), Licitações Públicas (14.133/2021), Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000), a Lei Geral de Proteção de Dados (13.709/2018), além de diversos artigos do Código Penal (2.848/1940) e da Constituição Federal (1988). Também existem várias ações, como o Dia Internacional contra a Corrupção, criado durante uma convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) em 2003 sobre o assunto e celebrado em 9 de dezembro. “Segundo a ONU ‘corrupção é um fenômeno social, político e econômico que afeta todos os países. A corrupção mina as instituições democráticas, retarda o desenvolvimento econômico e contribui para a instabilidade governamental’. A ideia central dessa data é fortalecer a cooperação internacional para ampliar a prevenção e o combate à corrupção no mundo todo e aumentar a conscientização sobre o tema”, destaca Cruz.

Cada integrante da sociedade, porém, também tem um papel fundamental e multifacetado no combate à corrupção. Sua responsabilidade não é só fiscalizar o trabalho dos políticos, mas também adotar atitudes que não sejam corruptas no dia a dia. “Cabe a cada indivíduo cultivar valores éticos, recusar práticas corruptas e participar ativamente da vida política. Educação cívica, denúncias de irregularidades e apoio a instituições que promovam a integridade são passos cruciais. A corrupção afeta diretamente a sociedade e cada cidadão tem o poder de contribuir para sua erradicação”, reforça Reis.

Se cada um começar a fazer a sua parte – mesmo que seja com pequenos passos –, seremos capazes de combater todo tipo de corrupção e recuperar a credibilidade na política e na sociedade como um todo. Faça a sua parte.

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Colaborador

Laís Klaiber / Fotos: EvilWata\gettymages / skynesher\gettymages / karenfoleyphotography\gettymages