Vitaminas a qualquer custo?

Empresas charlatãs tentam vender cigarros eletrônicos com supostas substâncias “saudáveis”, apesar de o produto ser ilegal no Brasil

Um novo modelo de cigarro eletrônico (conhecido também como “vaper”) chamou recentemente a atenção nas redes sociais por prometer benefícios à saúde. Trata-se de uma suposta ferramenta para a inalação de vitaminas, hormônios e produtos “naturais”.

Rapidamente, no dia 1º de março, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgou uma nota reafirmando algo que já estava claro, apesar de empresários oportunistas fazerem vista grossa lançando produtos absurdos como o “vaper de vitaminas”: a comercialização, importação e propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidos, “independentemente de sua composição e finalidade”.

A despeito da lei, uma empresa de Curitiba (PR) veiculou vídeos em suas redes sociais anunciando o “health vaper” (“vaper saudável”, em tradução livre) que viralizaram. Com a reação da Anvisa e o protesto de muitos usuários das redes, a empresa apagou a conta do Instagram. Nos vídeos, uma mulher em trajes de ginástica usava o dispositivo em uma academia enaltecendo as “qualidades” de “fumar vitaminas”, com as variedades de líquidos “para descansar” ou “para dar energia”. Há também propagandas desse produto que afirmam que ele ajuda a rejuvenescer e a aumentar a imunidade e até o foco.

A Anvisa continuou em seu comunicado: “a apresentação de vitaminas e outros alimentos oferecidos na forma de dispositivos eletrônicos para fumar (DEF) são proibidos, considerando que o próprio dispositivo não é permitido e que suplementos alimentares são produtos de ingestão oral. Recente veiculação em mídias sociais apresentam um produto que supostamente teria esta função, mas sem qualquer tipo de comprovação ou regularização no País”.

Além de a venda dos dispositivos ser proibida, não há nenhuma fiscalização para comprovar se há mesmo vitaminas e hormônios no líquido usado neles. Além disso, vapers podem causar danos pulmonares (inclusive irreversíveis) e outras doenças.

Charlatanismo midiático
O público está sempre em busca de resultados rápidos e que exijam pouco esforço, especialmente quando se trata de “boa forma” e saúde. Isso persiste apesar de ser comprovado e alardeado há anos que esse “atalho” não existe. Foi assim, por exemplo, que os anabolizantes sem indicação médica ganharam tanto espaço no início dos anos 2000 – justamente entre o público que frequenta academias e pratica esportes.

Depois vieram chás, óleos, cápsulas e aparelhos vendidos até pela TV que prometiam milagres para os preguiçosos que querem emagrecer, aumentar a musculatura, melhorar pele, cabelos e até a visão, sem o bom e velho suor, e, pior, sem fazer uma consulta a um médico. Vale ainda ressaltar as cirurgias e os tratamentos estéticos sem qualquer cuidado ou comprovação, que podem resultar até em morte.

Esse charlatanismo midiático só se mantém porque há público que lhe dá atenção, sem levar em conta as advertências de autoridades e profissionais de saúde. É urgente que as pessoas entendam, de uma vez por todas, que ter saúde é muito mais importante do que atender a certos padrões de beleza pregados por revistas, filmes de Hollywood e, cada vez mais, redes sociais. Enquanto isso não acontecer, sempre haverá estelionatários se aproveitando da ânsia e da pressa de quem quer “parecer bem na fita”.

Não estão nem aí para a lei
Apesar de proibidos no Brasil, os cigarros eletrônicos são ofertados livremente na internet e em tabacarias – tipo de comércio que tem crescido de uma forma sem precedentes no País, inclusive com a venda de itens para o consumo de maconha.

A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) afirmou em comunicado público que é cientificamente comprovado que a fumaça dos cigarros eletrônicos não tem apenas vapor de água e também apresenta produtos potencialmente cancerígenos, como metais pesados e solventes, alguns provenientes da composição do próprio aparelho, que oferecem riscos aos pulmões e ao coração.

Nos Estados Unidos, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês) concluiu que até as vitaminas podem ser perigosas por inalação nos vapers, como o acetato de vitamina E, que causou danos à saúde de mais de dois mil fumantes por vapor no país norte-americano em 2019, segundo a agência. Naquele período aconteceram pelo menos 40 mortes relacionadas ao uso dos vapers no país.

Convenções e blasfêmia
Apesar de todos os alertas, o número de usuários dos cigarros eletrônicos cresce cada vez mais mundo afora. Há até uma convenção internacional voltada para eles com as “novidades” em produtos lícitos e ilícitos do ramo, realizada em países como Estados Unidos, África do Sul e Filipinas, entre outros.

Participam desses eventos mulheres seminuas, há distribuição de bebidas alcoólicas (algumas consumidas em forma de óleo vaporizado nos aparelhos) e até blasfemação, como a paródia do Senhor Jesus fumando vaper em uma cópia da Santa Ceia.

Além disso, milhares de usuários de vapers chegam, em algumas palestras ou shows, a exalar colossais nuvens de vapor com um sem-número de substâncias misturadas, novamente aspiradas por qualquer um que esteja no meio delas. Parece que nem mesmo uma pandemia de um vírus de contágio aéreo fez algum efeito nos fumantes.

Instituições públicas e privadas voltadas para a saúde em vários países têm comprovado cada vez mais que, ao contrário da ilusão que os produtores e vendedores de vapers tentam vender à clientela, cigarro é cigarro, seja eletrônico ou não, e sempre fez mal.

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Colaborador

Redação / Fotos: Getty Images e reprodução