Quando a parcela é do botox

Com a popularização de clínicas de aplicação de toxina botulínica, assim como das promessas do mercado estético, os riscos atrelados aos procedimentos feitos sem os cuidados necessários batem à porta

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Nada de rugas e vincos na pele: esse é o objetivo de quem busca aquela aplicação que promete rejuvenescer o rosto – e quiçá a alma –, resgatar a juventude e afastar qualquer sinal de idade. Esticar daqui e dali, preencher o rosto com ácido hialurônico, submeter-se à harmonização facial e fazer microagulhamento para levantar o colágeno da tumba da epiderme são possibilidades que agora estão ao alcance de todos nós.

Essa espécie de “conto de fadas” em que a transformação da aparência é a meta está disponível até em shoppings. Nesses locais, diversas vitrines exibem anúncios que viabilizam o parcelamento dos procedimentos sem muitos pré-requisitos: basta pagar, agendar e dar adeus às “imperfeições”. A facilidade de adquirir pacotes que parecem embrulhados por uma varinha de condão, no entanto, pode cobrar caro, uma vez que a popularização de procedimentos estéticos invasivos vem acompanhada pelo aumento dos riscos para quem se submete a eles.

Recentemente, uma criadora de conteúdo viralizou na internet ao expor um caso malsucedido de harmonização facial que terminou com a perda do lábio superior. Ela acreditava que o procedimento tinha sido feito com ácido hialurônico, mas, na realidade, foi injetado polimetilmetacrilato, também conhecido pela sigla PMMA, um produto que não é absorvido pelo corpo. Já uma nutricionista que fez um preenchimento labial em uma clínica dentro de um shopping relatou na internet que teve alergia ao ácido hialurônico e enfrentou vários problemas por causa disso.

TOXINA OU TÓXICA?
À Folha Universal, o médico Marcos Rabelo, especialista em harmonização orofacial e membro do CEF Instituto, diz que “os riscos associados a procedimentos estéticos podem variar dependendo do tipo de procedimento realizado, mas os mais comuns são reações alérgicas a produtos utilizados, infecções, sangramento, hematomas, assimetria, resultados insatisfatórios, danos aos nervos ou tecidos adjacentes, cicatrizes indesejadas, efeitos colaterais adversos e, em casos extremos, complicações graves que podem colocar em risco a saúde ou a vida do paciente.”

Rabelo destaca a necessidade de “entender completamente os potenciais riscos, os efeitos colaterais e as possíveis complicações que o procedimento pode causar, além de avaliar sua própria saúde geral e discutir quaisquer condições médicas preexistentes com o profissional e se certificar de que o ambiente onde o procedimento será realizado é seguro e higiênico.”

Quanto aos profissionais que podem conduzir os procedimentos invasivos, “isso depende do tipo específico de cada um deles. Em geral, dermatologistas, cirurgiões plásticos, cirurgiões estéticos, cirurgiões-dentistas como os especializados em bucomaxilofacial e/ou o especialista em harmonização orofacial podem fazê-los”, esclarece.

ENTRE AGULHAS E FILTROS
Rabelo observa que “em um contexto de redes sociais, as comparações podem exercer uma influência significativa” nas pessoas, pois as plataformas exibem vidas “aparentemente perfeitas e imagens idealizadas”, o que leva os usuários a comparar suas vidas, aparência e realizações com as dos outros. “Isso pode resultar em sentimentos de inadequação, inveja, baixa autoestima e até depressão”, alerta. Nesse caso, ele lembra a necessidade de cultivar a consciência crítica em relação ao conteúdo que se consome. “As pessoas geralmente compartilham alguns destaques de suas vidas e não a totalidade de suas experiências. Focar em autoaceitação, definir metas realistas e limitar o tempo gasto nas redes sociais podem ajudar a reduzir os efeitos negativos das comparações”, aconselha.

Quanto à busca pelo corpo perfeito, Rabelo acredita que quem compreende a “perfeição” como uma ideia subjetiva e inatingível consegue manter o bem-estar físico e emocional com mais facilidade. “Para isso, vale priorizar a saúde física e mental e não a aparência, adotar hábitos alimentares saudáveis, praticar exercícios de forma equilibrada e buscar ajuda profissional, se necessário. É importante cultivar uma relação saudável consigo mesmo e reconhecer que o valor pessoal não está ligado à aparência”, arremata.

A PASSOS LARGOS

Se agora é possível adentrar em clínicas de estética como se fossem uma espécie de santuários é porque o mercado está em alta. No ano passado, como aponta o relatório Aesthetic Medicine Market Size & Growth, o setor foi avaliado em mais de US$ 127 bilhões. Os procedimentos não cirúrgicos (como as injeções de toxina botulínica, o botox) representam mais da metade da procura global. Há tempos, vale ressaltar, o Brasil ocupa o segundo lugar quando o assunto é cirurgia plástica, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, de acordo com a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (Isaps).

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Colaborador

Flavia Francellino / Fotos: bluecinema/gettyimages / DarioGaona/gettyimages