Produto “natural” ou veneno em cápsula?
O caso da enfermeira que morreu depois de sofrer uma hepatite fulminante reacende o alerta sobre compostos autointitulados emagrecedores e sobre o risco do vale-tudo na hora de perder peso
Em São Paulo, uma enfermeira de 42 anos morreu na madrugada de 3 de fevereiro depois de sofrer uma hepatite fulminante. Ela tinha sido submetida a um transplante de fígado de urgência, mas não resistiu. A mulher, que não tinha nenhum problema de saúde prévio, teria sofrido uma lesão no fígado após consumir cápsulas de um composto autointitulado emagrecedor feito com ervas.
O produto, chamado “50 ervas emagrecedor”, tinha ingredientes como chá verde, cavalinha, cidreira e hibisco, além de colágeno, spirulina (componente rico em clorofila) e até berinjela e vinagre de maçã. A maioria dessas substâncias é contraindicada apenas para gestantes, mas a junção de ervas muitas vezes desconhecidas pode ser letal para qualquer um.
O caso reacende a discussão em torno de produtos vendidos como emagrecedores naturais. Qualquer produto natural pode ser consumido à vontade e sem prescrição? Qual a diferença entre medicamento e suplemento alimentar? Quais são os limites entre o remédio e o veneno no uso de chás e ervas? Será que é mesmo possível emagrecer de forma rápida sem comprometer a saúde?
O composto usado pela enfermeira, por exemplo, propunha um “emagrecimento sem dietas” e ainda prometia inibir o apetite, regular o intestino, eliminar gordura localizada, celulite e estrias, além de controlar colesterol, diabete e obesidade – tudo isso apenas com a ingestão de duas cápsulas por dia. Seria um milagre em forma de cápsula? E você: o que faria (e faz) para se livrar dos quilos a mais? Quando o assunto é emagrecimento, será que devemos partir para o vale-tudo?
“PRODUTO IRREGULAR”
Em nota, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirma que o “50 ervas emagrecedor” é um “produto irregular” e alerta que ele está proibido no Brasil desde 2020. A nota ressalta que o “comércio de produtos com propriedades terapêuticas não autorizados pela agência é uma atividade clandestina. (…) O produto ‘50 ervas emagrecedor’ não pode ser classificado como alimento ou mesmo como suplemento alimentar, pois contém ingredientes que não são autorizados para o uso em alimentos. Entre esses componentes estão chapéu-de-couro, cavalinha, douradinha, salsaparrilha, carobinha, sene, dente-de-leão, pau-ferro e centella asiática. Essas espécies vegetais têm autorização para uso somente em medicamentos, como fitoterápicos, e não em suplementos alimentares”.
O ARROZ COM FEIJÃO
Todos os dias muitas pessoas são seduzidas por promessas de emagrecimento que chegam por meio das redes sociais, da TV e até de familiares. Antes das cápsulas, os shakes industrializados fizeram sucesso com um forte apelo emagrecedor e a promessa de substituir refeições. A composição deles incluía, em geral, dois ou mais tipos de açúcares na “fórmula” e uma vasta lista de ingredientes que mal se sabia o nome. O mundo encantado do emagrecimento pode até vir na forma de pó e cápsulas, mas na vida real não é bem assim que funciona. O “arroz com feijão” do emagrecimento é formado por dieta e redução de calorias diárias, dentro de uma alimentação de qualidade, com controle da resposta hormonal e atividade física regular.
ONDE MORA O PERIGO?
Em entrevista à Folha Universal, a médica Cintia Cercato, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, faz um alerta: “de modo geral, muitos produtos ditos naturais podem, em excesso ou não recomendados, não apenas prejudicar o fígado, mas conter substâncias que podem ser tóxicas para os rins e mesmo para o coração”. Ela acrescenta que qualquer produto vendido sem bula, sem informações sobre seus componentes e que seja comprado sem recomendação especializada pode fazer mal à saúde.
Emagrecer sem risco
A obesidade é uma doença complexa e o tratamento deve ser individualizado, destaca Cintia. “Sabe-se que a gordura que se acumula na região da barriga está relacionada ao maior risco de desenvolvimento de diabetes, pressão alta, gordura no fígado e problemas como apneia do sono. Por isso, é importante ter um diagnóstico nutricional, que faz parte do check-up de saúde, e que as pessoas não deixem de procurar um profissional da saúde capacitado e habilitado, para poder auxiliar nesse processo de tratamento. Perder peso não é algo fácil.” Segundo a médica, não existe milagre em cápsula. “Todo tratamento para a obesidade envolve modificação do estilo de vida, melhora na qualidade da alimentação, aumento da atividade física e controle comportamental. Ainda que haja necessidade de tratamento farmacológico, a principal modificação é o estilo de vida”, finaliza.
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