Poliomielite: Perigo real e imediato

Doença que pode causar paralisia e até matar crianças e adultos foi erradicada no fim do século 20, mas pode voltar ao Brasil porque muitas pessoas se recusam a vacinar seus filhos

A poliomielite, também conhecida como pólio ou paralisia infantil, é uma doença que já havia sido erradicada no final do século passado, mas voltou a preocupar o Brasil por causa da teimosia de algumas pessoas de se posicionarem contra a vacinação de si mesmas e de seus filhos – principalmente em razão das fake news espalhadas pela internet. A doença pode causar deficiência motora, incapacidade respiratória e até matar.

A taxa de vacinação contra a doença no País está abaixo de 70%, índice inferior à meta do Ministério da Saúde de imunizar 95% das crianças abaixo de 5 anos. A situação também é alarmante nos Estados Unidos. Em outubro, a governadora de Nova York, Kathy Hochul, declarou estado de emergência depois que a presença do vírus da pólio foi detectada em amostras de águas do esgoto de diferentes áreas do Estado.

A pólio é uma doença infectocontagiosa aguda causada por um vírus que vive no intestino, o poliovírus. Ela ocorre com mais frequência em crianças menores de 4 anos, mas pode acometer adultos – que também precisam se vacinar, caso não tenham sido vacinados na infância ou não tenham certeza se foram, segundo informa a Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz). O período de incubação da pólio varia de dois a 30 dias – o mais comum é que seja de sete a 12 dias.

Os sintomas, segundo a Fiocruz, podem ser simples, como febre, dor de garganta, mal-estar, dor de cabeça, de garganta e no corpo, náusea, vômito, constipação (prisão de ventre), dor abdominal, espasmos, rigidez na nuca ou diarreia, ou mais graves, como meningite, paralisia nas pernas, falta de desenvolvimento ou atrofia das mesmas, perda da força muscular e dos reflexos, insuficiência respiratória e até levar à morte.

A transmissão ocorre por contato pessoal direto, por objetos, alimentos e água contaminados com fezes de doentes ou portadores e gotículas de saliva e muco (ao falar, tossir ou espirrar). A falta de saneamento básico e de higiene pessoal ruim favorece muito sua disseminação.

Mais transmissível do que a covid
De acordo com Fernando Verani, epidemiologista da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), “enquanto a pólio existir em qualquer lugar do planeta há o risco de importação da doença. É um vírus perigoso e de alta transmissibilidade, mais transmissível do que o SarsCoV-2 (o vírus da covid-19), por exemplo. Estamos com sinal vermelho no Brasil por conta da baixa cobertura vacinal e é urgente que se faça algo. Não podemos esperar que aconteça a tragédia da reintrodução do vírus para tomar providências”.

Verani salienta que não existe um tratamento específico. Todas as vítimas de contágio devem ser hospitalizadas e receber tratamento para os sintomas, de acordo com seu quadro clínico.

Prevenção
A vacinação é a forma mais eficaz de prevenir a pólio, além da adoção dos bons hábitos de higiene. Toda criança menor de 5 anos deve ser vacinada conforme esquema de vacinação de rotina, que está disponível gratuita e permanentemente nos postos de saúde e por meio da campanha nacional anual. O esquema vacinal é de três doses da vacina injetável (VIP) quando a criança tiver 2, 4 e 6 meses e mais duas doses de reforço com a vacina oral bivalente (VOP), a popular gotinha, sendo a primeira dose quando a criança tiver 1 ano e 3 meses e a segunda até os 5 anos. É muito importante vacinar as crianças, pois seu sistema imunológico ainda não está totalmente formado.

Apesar de o Brasil não registrar casos de pólio desde 1989, a queda das taxas de vacinação pode fazer a perigosa doença voltar. A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) advertiu em setembro que esse risco é muito alto. Em razão disso, o ministro da Saúde brasileiro, Marcelo Queiroga, fez um apelo em rede nacional no início de novembro: “precisamos vacinar a população, principalmente nossas crianças. É inaceitável que, em pleno século 21, nós tenhamos sofrimento das nossas crianças por doenças que já estão erradicadas há muito tempo”.

A pólio está voltando em alguns países nos quais já havia sido erradicada e nunca desapareceu em três deles (Nigéria, Paquistão e Afeganistão). Por isso, Verani alerta que caso haja uma “importação” da enfermidade, o sistema de saúde brasileiro pode não conseguir agir com rapidez para evitar o contágio: “se o vírus for reintroduzido e não houver uma notificação rápida do caso, podemos ter uma epidemia. Com as baixas coberturas vacinais que temos hoje, as crianças estão desprotegidas. Podemos ter centenas ou milhares de crianças paralíticas como consequência”.

Vacina sempre
Apesar de a campanha nacional de vacinação contra a pólio ter se encerrado em setembro, a vacina continua disponível gratuitamente nos postos de saúde de todo o Brasil. É muito importante que todas as crianças até os 5 anos sejam imunizadas, como enfatizou o ministro Queiroga: “faço um apelo aos pais, avós e responsáveis: vacinem suas crianças contra a poliomielite. Não podemos negar esse direito ao futuro do nosso Brasil”.

Sequelas

A Fiocruz destaca que a poliomielite frequentemente tem sequelas relacionadas à infecção da medula e do cérebro pelo poliovírus, normalmente motoras e sem cura.

As principais são:

– problemas e dores nas articulações;

– pé torto (conhecido como “pé equino”, que causa dificuldade em andar porque o calcanhar não encosta no chão);

– crescimento diferente das pernas, o que faz a pessoa se inclinar para um lado e mancar, causando desvio na coluna (escoliose);

– osteoporose;

– paralisia de uma das pernas;

– paralisia dos músculos da fala e da deglutição (ato de engolir), o que causa acúmulo de secreções na boca e na garganta;

– atrofia muscular; e hipersensibilidade ao toque.

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Colaborador

Redação / Foto: Getty Images