Os riscos da obesidade juvenil

O sobrepeso entre jovens brasileiros quase dobrou nos últimos dez anos. Ter hábitos saudáveis desde cedo pode evitar consequências sérias durante a vida toda

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A obesidade é um problema de saúde pública que atinge grande parte da população mundial. Hoje, mais de 2 bilhões de pessoas estão acima do peso no mundo todo, sendo que 60% delas estão na América Latina.

No Brasil, atualmente, mais da metade da população adulta está com sobrepeso e cerca de uma em cada cinco pessoas é obesa.

Entre a população juvenil, a situação também é bem drástica. De acordo com uma pesquisa recente do Ministério da Saúde, a prevalência da obesidade entre os jovens entre 18 e 24 anos quase dobrou de 2006 a 2016, passando de 4,4% para 8,5%. A análise consta da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), de 2016.

O excesso de peso é preponderante durante a adolescência. Segundo a última pesquisa realizada em 2014 pelo Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes (Erica), 7,8% dos alunos do País entre 13 e 17 anos estão obesos.

Se a obesidade já é um problema na adolescência, provavelmente continuará sendo na vida adulta. A endocrinologista Carmen Cervi Santana comenta que geralmente os pais não interferem na rotina do filho quando ele já está engordando, o que faz com que ele continue ganhando peso. “Quando chega a adolescência, os pais não veem o excesso de peso do filho como um problema. Por isso, acabam não fazendo nenhuma intervenção em sua rotina de alimentação e de atividade física. Então, esse é um passo para que ele se torne um adulto obeso”, afirma.

Ela destaca que os deslizes com a alimentação já começam na infância, com a introdução de alimentos hipercalóricos. “Muitas crianças, até mesmo aquelas que nem estão em idade escolar, consomem muitos alimentos ultraprocessados, ricos em gordura e açúcares, dando início à raiz da obesidade”, declara.

Foi o que aconteceu com o estudante João Vitor Fernandes, de 18 anos (foto abaixo), que começou a engordar aos 7 anos, depois da morte de seu avô. “Comecei a comer compulsivamente para tentar preencher o vazio que a ausência dele me causava. Por causa da ansiedade, comia rápido demais, sem mastigar direito os alimentos”, conta.

A alimentação do menino não era saudável. Ele comia muitos doces e massas e bebia muito refrigerante. Então, foi engordando aos poucos até chegar aos 105 quilos.

Nessa fase, a obesidade já tinha lhe trazido inúmeros problemas físicos. “Eu tinha muitas dores no corpo e nas costas e não conseguia dormir, pois sentia muita falta de ar”, diz.

Emocionalmente, João Vitor também via as consequências do excesso de peso. “Eu sofria bulliyng dos colegas e me sentia inferior às outras pessoas.”

Farto dessa situação, aos 16 anos, João Vitor decidiu que precisava emagrecer, caso contrário iria adquirir mais problemas ao longo dos anos. “O primeiro passo foi ter determinação para iniciar a trajetória de emagrecimento.”

Não demorou muito para que ele começasse a ter uma alimentação saudável e passasse a fazer exercícios físicos, como caminhadas, lutas e crossfit (treinos de força e condicionamento físico de alta intensidade).

Para chegar aos 76 quilos que tem hoje o processo de emagrecimento durou um ano. Contudo, ele afirma que continuará com os mesmos hábitos saudáveis para a vida toda. “Continuo fazendo dieta e exercícios físicos diariamente para manter o peso e não engordar novamente.”

Graves consequências

A obesidade não é apenas uma questão de estética, ela também está associada ao surgimeto de doenças crônicas, como pressão alta, diabetes e problemas cardiovasculares. Fora isso, há também os impactos psicológicos e sociais que afetam a vida do jovem e das pessoas com as quais ele convive. “Cada vez mais cedo os jovens estão tendo que tratar doenças relacionadas ao excesso de peso. Hoje há jovens de 15 a 25 anos tomando remédios para doenças que apareciam em outras faixas etárias, como aos 40, 50 anos”, diz a endocrinologista.

A auxiliar contábil Débora Suhr Antunes, de 40 anos (foto abaixo), foi obesa desde a infância e quando chegou à juventude começou a apresentar diversos problemas de saúde, como depressão, varizes, trombose, hipertensão, duas hérnias de disco na coluna e estava perto de se tornar diabética.

Quando era adolescente, ela havia feito algumas dietas restritivas e tomado medicação para emagrecer, mas não obteve sucesso. Além disso ter feito mal à sua saúde, ela voltava a ganhar novamente todo o peso que tinha eliminado porque seus hábitos continuavam os mesmos. “Com 16 anos e no meu primeiro emprego, eu tinha muito acesso a fast-food e podia comer o que quisesse, pois tinha o meu próprio dinheiro para comprar. Por isso passei a ter o chamado efeito sanfona, de engordar e emagrecer.”

Quando se casou, seus hábitos alimentares só pioraram. “Na maioria das vezes chegava muito cansada do trabalho e corria para o mais prático e rápido, ou seja, lanches, pizza, macarrão instantâneo e comidas prontas. Aí que desandou de vez e virou algo incontrolável”, lamenta.

Com o passar dos anos e já madura, Débora desenvolveu outras doenças. Em 2010, ela descobriu que o lado esquerdo do seu diafragma estava paralisado. “O diafragma é um músculo que separa o abdômen do tórax e se movimenta conforme a respiração do pulmão. Esse músculo ficou mais fino e subiu, então meus órgãos (estômago, baço e pedaço do colo do intestino), com a pressão abdominal causada pela obesidade, se elevaram”, explica.

Em 2014 ela teve outro problema grave de saúde: uma embolia nos dois pulmões que poderia colocar sua vida em risco. “Quando estava internada foi feito um exame do coração para verificar se essa doença não havia deixado sequelas. Então, foi diagnosticado que eu tinha uma comunicação interarterial (abertura entre as artérias).”

Aos 39 anos, já com mais de 150 quilos, Débora resolveu mudar suas atitudes. “Eu era uma verdadeira bomba-relógio, pois cada vez apareciam mais problemas de saúde. Ou eu emagrecia ou poderia esperar pelo pior.”

Ela seguiu a orientação médica e fez uma cirurgia bariátrica (redução de estômago), alertada de que esse procedimento não seria a solução para a obesidade. “Eu teria que manter uma alimentação saudável e fazer atividade física a vida toda.”

Hoje, com 85 quilos, ela mantém um cardápio variado e saudável, faz refeições a cada três horas, se alimenta com calma e pratica atividades físicas. “Prefiro comer mais saladas e proteínas, como carne e ovos, e poucos alimentos com carboidrato, como arroz e batata, do que um pedaço de pizza ou um lanche. Tive uma mudança de paladar”, comemora.

Após ter eliminado peso, ela repetiu o exame do coração e viu que a abertura não existe mais. “A médica responsável disse que isso realmente poderia acontecer com a perda de peso, mas que o caso era muito raro. Acredito que fui abençoada por Deus.”

Mudança de pensamento

A administradora Adria Lima, de 27 anos (foto abaixo), também sabe o quanto o excesso de peso pode trazer graves consequências desde cedo.

Depois de começar a engordar na adolescência, ela chegou ao grau leve de obesidade aos 18 anos e, aos 24 anos, atingiu 107 quilos.

Ela já tinha tendência para engordar em razão de ter hipertireoidismo, mas, por causa de um mau relacionamento afetivo, passou a ganhar peso exageradamente. “Eu me sentia vazia, triste, inferiorizada e comia doces sem limites. Se estava triste, comia; se estava feliz, comia também”, argumenta.

Como fazia faculdade à noite, jantava alimentos industrializados e lanches e não seguia os horários das refeições. Além disso, era sedentária. “Em função da minha rotina, nas horas vagas passava longe de exercícios ou de qualquer coisa que pudesse me cansar”, admite.

Não demorou muito para que Adria começasse a apresentar sérios problemas na coluna. “Passei a ter hérnia de disco, gastrite nervosa e ovários policísticos.”

Como se não bastassem as doenças físicas, ela também teve que combater os problemas emocionais. “Era ansiosa, complexada e totalmente insatisfeita com o meu corpo. Odiava comprar roupas”, assume.

Depois de ficar um mês acamada por causa do problema de coluna, ela decidiu que precisava emagrecer. “Quando fiquei de cama pude refletir em que ponto eu havia chegado por não me cuidar. Me senti impotente diante da situação e me revoltei. Em maio de 2016, ao sair da cama, dei início à luta para perder peso.”

A primeira decisão foi reconhecer que precisava mudar sua rotina. “Tirei de minha alimentação tudo o que era desnecessário e me matriculei em uma academia”, conta.

Atualmente, Adria pesa 84 quilos, mas ainda tem a meta de alcançar o peso ideal para a sua altura, que é 75 quilos. “Para chegar ao meu objetivo, mantenho os mesmos hábitos”, finaliza.

Rotina apressada

A nutricionista Angélica Grecco, do Instituto Endovitta, comenta que a alimentação não é prioridade para o jovem brasileiro, tendo em vista a quantidade de atividades que ele costuma realizar diariamente. “Os jovens vivem apressados e, na correria do dia a dia, a alimentação passa a ser apenas um item das tarefas diárias. Com isso, houve aumento do consumo de alimentos processados e de lanches rápidos e também do ato de comer mexendo nos celulares”, justifica.

Entretanto, ela destaca que a rotina agitada dos jovens não deve ser desculpa para não dedicarem parte do dia aos hábitos saudáveis e que isso vale inclusive para aqueles que não se alimentam em casa. “É fundamental parar para almoçar, tentar comer na companhia de outras pessoas e dar preferência aos locais que servem refeições feitas na hora. Esses restaurantes, normalmente, oferecem pratos que são feitos com alimentos in natura e minimamente processados”, enfatiza.

É importante também conhecer os alimentos que consome e tentar preparar a própria comida. “Quando temos tempo para preparar uma refeição, temos maior facilidade de acessar alimentos mais saudáveis. E, quando somos nós que cozinhamos, podemos usar óleos, gorduras, sal e açúcar em quantidades menores”, reforça a nutricionista.

Ela ainda ressalta que o sedentarismo, geralmente associado à falta de tempo, também é o grande vilão da obesidade nessa fase. “Há uma redução nas atividades que promovam gasto calórico. Muitos jovens usam excessivamente os elevadores em vez de subir escadas, andam de carro e moto e não a pé e, mesmo quando estão ociosos, ficam concentrados na tela do televisor e do celular e não se movimentam.”

Para ela, a atividade física é capaz de barrar a obesidade porque auxilia na escolha de outros hábitos saudáveis. “Quando o jovem passa a cuidar do corpo, mantém também equilibrado seu emocional. Sua autoestima se eleva, ele passa a ter uma boa relação interpessoal com as pessoas, aumenta sua autoconfiança e, com certeza, terá melhor qualidade de vida e longevidade”, declara.

Leonardo Ferreira Miranda, de 19 anos (foto abaixo), que é sócio-proprietário de uma empresa, recorreu aos exercícios físicos, aliados à alimentação saudável, para sair de seu peso, que era 108 quilos.

Ele começou a engordar aos 11 anos porque passou a comer muitos doces, salgados, pães e café com leite. Além disso, não respeitava o horário das refeições.

Quando o excesso de peso começou a lhe trazer muitas limitações físicas, ele refletiu sobre sua situação. “Eu não tinha energia para fazer nada que precisasse de algum esforço físico porque ficava cansado muito rápido.”

O primeiro passo foi procurar ajuda de uma nutricionista. “Ela me passou um cardápio com alimentos saudáveis e sem mudanças radicais. Passei a segui-lo tranquilamente”, conta.

Depois, Leonardo recorreu à academia. “No início, foi muito difícil, mas depois consegui fazer as atividades constantemente”, afirma.

Após quatro meses, ele conseguiu eliminar 25 quilos (está com 83), mas sabe que precisa continuar controlando sua alimentação porque tem tendência a engordar. “Hoje só como dentro dos horários, evito refrigerantes e continuo frequentando a academia”, conclui.

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Colaborador

Por Janaina Medeiros/ Fotos: Fotolia, Marcelo Alves e Cedida