Não é de hoje que paira pelo Brasil a descrença na política. O tema é visto com tanto desdém que as propagandas para angariar votos no período de eleição são verdadeiras piadas, principalmente quando se trata do poder legislativo. O pior é que em suposto sinal de protesto muitas pessoas são eleitas, mesmo estando despreparadas para ocupar o poder. Mas o descontentamento não se restringe a essa esfera e alcança de forma geral a política.

Segundo um estudo realizado pelo Instituto Ipsos (terceira maior empresa de pesquisa de mercado do mundo) em 2022, seis a cada dez brasileiros acreditam que os partidos políticos não se importam com a população. Além disso, 65% dos entrevistados afirmaram que o Brasil precisa de alguém que tenha sintonia com os anseios da maioria da população para resgatar o País de ricos e poderosos. Esse cenário, no entanto, não é exclusividade nacional. Entre os 28 países analisados, a Romênia lidera o ranking dos descrentes em relação aos partidos políticos, com 79%.

Esse descontentamento em grande escala estaria ligado à falta de resultados benéficos à população. “Temos que lembrar que uma sociedade se converte em uma sociedade política com o único objetivo de que o Estado, a própria política, busque a solução para os problemas que são considerados seus. Quando a política não consegue dar essas respostas gera esse sentimento de desagrado, de que ela não está seguindo o rumo correto”, afirma o cientista político Valdir Pucci.

E é o que tem acontecido inclusive em grandes potências como os Estados Unidos e o Reino Unido. Enquanto um levantamento da NBC (rede de televisão norte-americana) revelou que 74% dos americanos acreditam que o país está indo para o rumo errado, um levantamento da YouGov (que pesquisa o mercado na internet) indicou que 70% da população do Reino Unido tem o mesmo sentimento. “O grande índice de descontentamento com a política tem muito a ver com a entrega dos agentes políticos que hoje estão comandando esses países. Independentemente do espectro político que eles ocupem, a sociedade não percebe a agilidade que gostaria de ter e entregas para as questões econômicas, fiscais ou que tenham grande impacto na vida da sociedade”, pontua Ricardo Holz, especialista em administração pública.

Na prática, a falta de mudanças com o passar do tempo reforça a ideia de que a política não favorece um ambiente que ajude o povo a resolver seus próprios problemas, pelo contrário, o Estado se faz presente em tudo e só atrapalha. Porém há um outro fator que estimula o pessimismo com relação à política: a falta de conhecimento dos cidadãos sobre o tema. “O jogo político é complexo e uma grande parte da população desconhece esse mecanismo, então se cria uma expectativa muito grande no processo eleitoral e, quando os candidatos assumem o poder, essas mudanças não acontecem na mesma velocidade que foi a campanha, elas são muito morosas. O que vai causando cada vez mais frustração”, explica Holz.

Riscos e impactos negativos
Não é porque a política é complexa que o cidadão deve deixá-la de lado, ao contrário, buscar compreender esse processo é essencial para uma mudança positiva. Isso porque a descrença na política pode enfraquecer a democracia tornando os países que passam por essa condição presas fáceis de ditadores disfarçados de democráticos.

É importante entender que o paradoxo direita/esquerda não é a resposta para as perguntas que a população carrega e pode trazer ainda mais questionamentos, afastando as pessoas de seus direitos e deveres e tirando do país o principal ingrediente para o seu crescimento e desenvolvimento: a estabilidade.

De acordo com Holz, momentos de vulnerabilidade da população como economia em baixa, alta de preços e até mesmo a grande insatisfação com o método da política tradicional são aproveitados para inserir a ideia de que um parlamentar é o ideal para resolver a situação, mesmo podendo não estar preparado. “A descrença com a política pode fazer com que as pessoas acabem acreditando em um ‘salvador da pátria’. Isso acontece de tempos em tempos no Brasil e em outros países, inclusive em diferentes espectros, seja na esquerda ou na direita”.

A necessidade urgente de mudanças levou, por exemplo, ao poder Donald Trump, nos Estados Unidos, Jair Bolsonaro no Brasil e Giorgia Meloni na Itália, além de ter colocado como número um dos eleitores argentinos o economista e professor Javier Milei, que está em completa oposição ao atual governo de Alberto Fernandez, cujos resultados têm desagradado em muito à população. Cabe a você o julgamento dessas escolhas.

A fonte da esperança
Não há dúvidas de que a democracia genuína é o caminho mais saudável para estabelecer mudanças dentro de uma sociedade. E apesar de toda a descrença que paira no mundo, é preciso reunir as forças para abraçar o conhecimento. Sem entender como funciona a política, especialmente no Brasil, é impossível mudar, afinal, como cobrar respostas de uma pessoa se não se sabe qual é o seu real papel?

“A política não pode ser vista apenas como um ambiente corrupto. É claro que a corrupção existe e precisa ser combatida, mas ela não pode resumir a política no país. Por isso é preciso maiores esclarecimentos sobre o tema. Quando a pessoa vê a política como um ambiente de debate, de consenso, sem radicalismo, ela começa a participar mais do processo de construção da sociedade”, ressalta Pucci.

O cientista político reforça ainda que a população não deve esperar que a política resolva tudo, mas cada cidadão deve se tornar ativo na sociedade, “seja pelo voto, pela manifestação, pelo envio de uma mensagem ao parlamentar. Uma sociedade consciente entende que a política deve ser utilizada para os interesses da sociedade”. É desta forma que o poder que está nas mãos do povo é fortalecido e direcionado para o caminho certo: o crescimento do Brasil.