O lado unilateral (e cruel) da depressão

Uma dor inexplicável que encontra abrigo na alma e sequestra o ritmo natural da vida. Por causa dela, sonhos se desfazem e pessoas definham. O cenário atual indica a maior crise depressiva de todos os tempos

Imagem de capa - O lado unilateral (e cruel) da depressão

Séculos atrás, em um período sombrio, prisioneiros eram jogados em uma masmorra e deixados lá, cruelmente sozinhos, definhando na companhia de seus pensamentos. É também nesse calabouço que muitas pessoas vivem hoje porque estão em depressão. Só quem está enclausurado nessa doença sabe exatamente a dor que ela causa. O ‘x’ da questão é: quem a assiste de fora costuma ignorá-la e concluir que “não é nada de mais”.

Não são, infelizmente, poucas pessoas que experimentam essa sensação dolorosa. Atualmente, cerca de 300 milhões de pessoas no mundo sofrem com a doença, como indicam os números da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e o Brasil é o país com a maior prevalência de casos na América Latina, de acordo com o relatório Depressão e Outros Transtornos Mentais, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em seguida, aparecem Cuba, Barbados, Paraguai, Bahamas, Uruguai e Chile.

Segundo a OMS, 5,8% da população brasileira sofre de depressão, o equivalente a 11,7 milhões de pessoas. Um estudo epidemiológico do Ministério da Saúde revela, contudo, que nos próximos anos até 15,5% da população brasileira pode sofrer de depressão pelo menos uma vez na vida. As mulheres aparecem na liderança na lista de pessoas mais suscetíveis a desenvolver a doença.

O Relatório Mundial de Saúde Mental de 2022 já apontava a piora dos transtornos mentais em todo o mundo, com aumento superior a 25% de novos casos de depressão e ansiedade, e, segundo a OMS, essa foi “a maior revisão da saúde mental mundial desde a virada do século”. Apenas no primeiro ano da pandemia de covid-19, 53 milhões de pessoas desenvolveram depressão e outros 76 milhões tiveram ansiedade, o que totaliza 129 milhões. “Os números mostram claramente que o peso da depressão (em termos de perdas para as pessoas afetadas) vai provavelmente aumentar, de modo que, em 2030, ela será sozinha a maior causa de perdas (para a população) entre todos os problemas de saúde”, afirmou o médico Shekhar Saxena, do Departamento de Saúde Mental da OMS, em entrevista à BBC.

A entidade estima que a depressão deve se tornar a doença mais comum do mundo, afetando mais pessoas do que qualquer outra, inclusive o câncer e as doenças cardíacas. Há outro dado curioso: depois de 24 anos, o Ministério da Saúde atualizou a lista de doenças relacionadas ao trabalho, que passou a conter mais 347 doenças que causam danos à integridade física ou mental do trabalhador, e incluiu a depressão.

PANORAMA MUNDIAL PELO JORNALISMO
Não à toa, a depressão ganha as manchetes dos noticiários mundo afora. Um artigo no site do jornal The New York Times detalhou a maneira devastadora que a depressão e a ansiedade afetam o corpo, destacando que mente e corpo formam uma via de mão dupla: “uma doença mental não tratada pode aumentar significativamente o risco de adoecer fisicamente e distúrbios físicos podem resultar em comportamentos que pioram as condições mentais”.

Para a revista norte-americana Time, “há um aumento surpreendente na depressão grave entre adolescentes nos Estados Unidos”. Pode-se ler na matéria: “(…) embora ansiedade e tristeza não sejam fenômenos novos entre os adolescentes, tem havido um aumento significativo na porcentagem de jovens entre os 12 e os 20 anos que relataram ter tido um episódio depressivo maior”.

Quando o assunto são as crianças em fase pré-escolar, outra reportagem do veículo observou que elas podem sofrer de depressão grave e um estudo publicado na JAMA Psychiatry apontou que, em um grupo de 193 crianças com idades entre 3 e 6 anos, 90 apresentaram diagnóstico de transtorno depressivo maior.

RAIO X DA DEPRESSÃO
O médico Djacir Figueiredo Neto, chefe da psiquiatria do Hospital Moriah, de São Paulo (foto a esq.), em entrevista à Folha Universal, disse que as “discussões acerca de saúde mental estão cada vez mais presentes na nossa sociedade, algo que ajuda a pessoa que está em sofrimento a entender o que está acontecendo com ela”. Quanto à chegada cada vez mais cedo da depressão na fase infantojuvenil, ele destaca como causas mais discutidas “a exposição crônica a um evento estressor (como bullying, abuso psicológico, assédio moral) ou exposição aguda a um evento traumático, contato precoce com o uso de substâncias psicoativas e desamparo familiar”.

Mas, afinal, o que é depressão? Segundo Djacir, “é um dos transtornos do humor caracterizado por tristeza ou perda de capacidade de sentir prazer nas coisas que se gosta que vem acompanhado de alteração de sono, apetite, libido, concentração e energia que permanece por determinado período de tempo e acarreta prejuízos no funcionamento usual da pessoa. Ou seja, não é uma ‘tristeza muito grande’, mas um estado de adoecimento que reflete na rotina, nos relacionamentos e nas funções (lazer, trabalho, estudo, etc.) que a pessoa exerce”.

Ele diz que o paciente chega ao consultório com pensamentos vinculados ao humor entristecido, como “eu não sou bom para coisa alguma,” ou queixas, como “não tenho vontade de fazer nada”, e aponta que esses pensamentos, muitas vezes, “vêm espontaneamente, sem exposição a um fator estressante específico e podem ser difíceis de serem afastados da mente. Um dos que mais sinalizam gravidade no quadro depressivo são os relacionados à morte, que passa a soar como uma resposta para o fim do sofrimento.”

Djacir pondera que, embora processos biológicos façam parte de um episódio depressivo, eles não são definidores. “O ambiente em que a pessoa está, características intrínsecas, como temperamento e personalidade, hábitos de vida e fatores genéticos são tão importantes quanto a parte biológica. Uma hipótese é de que determinadas vias cerebrais relacionadas ao quadro estão em atividade e permanecem assim, impedindo uma remissão espontânea. Essas vias são mediadas por diversas substâncias, como a serotonina, a dopamina e a norepinefrina (…). Como consequência do estado depressivo, outras substâncias do organismo podem sofrer impacto, como hormônios reguladores de apetite e substâncias mediadoras do sono”, diz.

FÉ PARA a ALMA APRISIONADA

Em Salmos 142.3-7, leem-se as palavras do rei Davi que demonstram a situação em que ele estava: “Quando o meu espírito estava angustiado em mim (…). Refúgio me faltou; ninguém cuidou da minha alma. A ti, ó Senhor, clamei; eu disse: (…) Tira a minha alma da prisão (…).” Na Bíblia Sagrada com Anotações de Fé, o Bispo Edir Macedo observou que “a solidão, os perigos e as perseguições são fatores desencadeadores de desespero” e que Davi estava escondido em uma caverna escura, sem recursos e cercado de inimigos. “No entanto, ele fez do Altíssimo a sua defesa. Os momentos mais propícios para termos uma experiência com Deus são aqueles em que os problemas parecem maiores do que as nossas forças. Davi não tinha forças para vencer o turbilhão de problemas que o afligiam. Ele estava preso a uma situação que o esmagava emocionalmente. No entanto desabafou com o Senhor toda a angústia e a ansiedade que o perturbaram. Isso mostra que a oração traz a convicção de que Deus vê as nossas lutas e nos socorrerá. (…).”

No programa Palavra Amiga, o Bispo Macedo ressaltou: “se você tem uma alma aprisionada, Jesus quer libertá-la. O trabalho da Universal foca o restabelecimento da saúde da alma e isso é feito por meio do ensinamento da Palavra de Deus.”

O Pastor Jefferson Garcia (foto acima) está à frente do projeto Depressão Tem Cura (DTC), que ampara espiritualmente quem está nessa situação. À Folha Universal, ele cita que “a depressão atinge não só a alma das pessoas, mas também o corpo. Uma pessoa com depressão vive desanimada, tem uma tristeza constante e sofre por antecipação, pois a depressão traz também insônia, pensamentos de suicídio e solidão. Ela paralisa a pessoa e a deixa incapaz até de cuidar de si mesma”. Assim, ele esclarece que a Fé é a única forma de curar a alma. “Quando quem sofre com depressão entender que através da Fé pode vencer toda a dor que sente na alma, fará uso dessa Fé com inteligência e colherá os benefícios disso. Quem está com depressão pode procurar ajuda médica, porém, nós temos provado que através da Palavra de Deus essa cura interior é notória”.

Remédios para tudo
A dor de um abuso aos 8 anos massacrou a autoestima e o valor da estudante de enfermagem Marciela Ferreira de Paes (foto a esq.), de 40 anos, que passou a conviver com o silêncio e com a culpa. Isso a afetou a ponto dela não sentir vontade nem de estudar. “Passei a sofrer com insônia, sentia muita tristeza e dores pelo corpo, além de ter maus pensamentos e desejo de morrer. Em decorrência do abuso, também surgiram os traumas e o medo e, logo, as drogas entraram na minha vida. Mas foi aos 14 anos que tive noção de alguns sintomas que já anunciavam a depressão. Fui criada pela minha avó e culpava minha mãe pelo que me acontecia”, conta.

Até que Marciela soube que sua mãe tinha sido diagnosticada com um tumor no crânio. “Ali foi meu fundo do poço: a depressão piorou muito pela culpa que passei a carregar. Além disso, me sentia incapaz de cuidar dela. No estado em que eu estava, como cuidaria da minha mãe se eu não podia nem cuidar de mim?”, indaga. Foi quando, aos 26 anos, ela foi parar no hospital. “Fui diagnosticada com depressão, ansiedade e síndrome do pânico”, cita. Ela menciona que enfrentou julgamentos. “Havia quem enxergasse meu comportamento como rebeldia ou que eu não passava de uma pessoa drogada. Para muitos eu não tinha mais jeito e, para a família, eu era um caso perdido”, afirma.

Ela conta que tentou o suicídio. “Cheguei a escrever uma carta de despedida e nela falei do abuso e de tudo que eu sentia”, relata. E, assim, ela seguiu fazendo acompanhamento profissional. “O médico receitou medicamentos fortes para eu acordar, outro à tarde, para me animar, e mais um à noite, para que eu pudesse dormir. No começo, eu me sentia bem, mas dias depois minha condição piorou, pois eu acordava e não sentia o corpo, que estava dormente. Foi um susto e, no desespero, lembrei de que, anos antes, um amigo tinha me levado à Universal”, destaca.

Ela relata o que aconteceu quando voltou à Igreja, há cerca de quatro anos: “no primeiro dia, já dormi bem e, com o passar do tempo, percebi que não precisava mais lidar com a dor. Então, notei que a Fé era a única chance que existia para mim. Em três meses, eu me libertei dos medicamentos e dos vícios”, declara. Marciela, que conviveu com a depressão por mais de 20 anos, hoje garante que está livre. “Não tenho depressão nem complexos. Concedi o perdão e me perdoei também. Me esvaziei das mágoas, dos traumas e uma paz invadiu meu ser. Tive um encontro com o Senhor Jesus e, desde então, minha vida mudou completamente”, conclui.

DOS PALCOS PARA A CAMA
Durante muitos anos, a microempresária Cássia Chagas, de 40 anos (foto a dir.), cantou profissionalmente nas noites. “Fui vocalista de uma banda e estava à frente do palco. Viajei constantemente realizando shows em casas noturnas com diversas bandas. Era uma vida de glamour. Eu era conhecida no mundo musical da época e muito requisitada para entrevistas nas rádios. Eu era um personagem perfeito e cuidava muito do corpo e da aparência”, relata.

Aos 20 anos, ela se viu em depressão, que perdurou por uma década. “Em razão de muitas frustrações e até pela vida familiar conturbada, eu passei mal em um show. Comecei a notar sintomas de ansiedade, o coração acelerado, falta de ar, formigamento nos braços e na face, além de um vazio constante. Fui levada às pressas para um pronto-socorro com a pressão arterial alterada. Depois de passar por muitos especialistas, fui diagnosticada com transtorno de ansiedade generalizada, estresse e síndrome do pânico. Por conta disso, passei a não me alimentar direito, tinha engasgos frequentes e descontava tudo isso no vício em cigarro. Fui acompanhada por psicólogos e psiquiatras e usei vários antidepressivos e ansiolíticos”, descreve.

Ela diz como sua vida mudou: “parei de cantar, não conseguia mais viajar nem ficar em cima do palco. A depressão me consumia. Eu achava que não servia mais para nada e chorava dia e noite. Eu queria morrer e, ao mesmo tempo, tinha medo da morte. Convivi com a sensação de sufocamento e passei noites sem dormir. Era como se nada tivesse razão”, analisa.

Em 2012, Cássia assistiu a um programa da Universal e decidiu pedir ajuda. Ao participar das reuniões, ela viu os sintomas desaparecerem. “Sem que me desse conta, em um mês eu já estava dormindo uma noite inteira sem precisar de medicamento. As palavras de ânimo e Fé me encorajaram e me deram esperança para prosseguir e vencer e, cerca de três meses depois, eu estava livre de tudo”, atesta.

“ELE ESTÁ FALANDO COMIGO?”
Hoje, Geyzon Melo, de 32 anos (foto a esq.), é biomédico habilitado em patologia clínica, especialista em imunologia clínica e doutor honoris causa em biomedicina, mas antes ele se enxergava apenas como uma pessoa depressiva. “Por volta dos 20 anos, no período em que cursava a graduação, eu buscava preencher o vazio com relacionamentos, família e bebidas. Além disso, eu trabalhava o dia todo e estudava à noite. Então, não tinha tempo para quase nada e isso me sobrecarregava muito. Comecei a ter crises de insônia e reagia como se estivesse vivendo uma vida sem cores. Por mais que eu estivesse concluindo o curso que era um sonho de criança e tivesse uma vida toda pela frente, eu não conseguia encontrar uma saída.”

Geyzon, que estudava para cuidar da saúde dos outros, não via saúde em si mesmo. “Eu já trabalhava, convivia com muitos pacientes depressivos e observava o tratamento clínico com as terapias e medicações. Me deparei com pessoas que viviam sedadas e muitas chegaram a cometer suicídio, inclusive, colegas de trabalho. Por vezes, eu via a depressão como ‘frescura’ ou uma tentativa de chamar a atenção, mas, quando comecei a comparar os sintomas que eu tinha com os relatados pelos pacientes, o que mais me angustiava era saber que, clinicamente, a depressão era uma doença que não tinha cura e que, em boa parte dos casos, evoluía de forma trágica. Por diversas vezes, eu via a morte como uma saída para colocar um fim no sofrimento, principalmente quando eu estava dirigindo meu carro”, conta.

Foram três anos nessa condição. “Minha avó materna conheceu a Universal, mas eu tinha um preconceito imenso. Um dia, quando estava dirigindo na estrada, voltando para casa, me vi muito angustiado, com muitas vozes me perturbando e o único pensamento que passava pela minha cabeça era que eu tirasse a minha própria vida. Então, eu decidi ligar o rádio, para não fazer nenhuma besteira, parei justamente em um programa da Universal e era a voz do Bispo Macedo. Quando eu ia desligar, ele disse: ‘você que está dentro desse carro, desesperado, pensando em tirar a sua própria vida, não faça isso! Existe uma saída para você.’ Então pensei: ‘ele está falando comigo?’”. Geyzon, então, decidiu buscar ajuda. “Fui muito bem recebido na Universal e, com apenas uma oração, o vazio que eu sentia desapareceu. Vi que havia algo diferente naquele lugar e, a partir daquele dia, decidi me entregar ao Senhor Jesus e logo me libertei da depressão. Hoje sou um homem completo, casado com uma mulher maravilhosa, realizado profissionalmente e tenho a oportunidade de ajudar pessoas que chegam à Igreja na mesma situação que cheguei”, finaliza.

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Colaborador

Flávia Francellino / Foto: Serg Zastavkin/getty images,divulgação, Demetrio Koch, Cedidas