“O Brasil tem religião oficial agora?”

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Essa pergunta foi feita pelo senador Magno Malta (PL-ES), diante da Resolução 715, aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), que apresenta 59 propostas para a saúde pública no Brasil. Publicada no dia 20 de julho, a resolução foi regida sob o lema Garantir Direitos, Defender o SUS, a Vida e a Democracia – Amanhã Vai ser Outro Dia!” e “dispõe sobre as orientações estratégicas (…) provenientes da 17ª Conferência Nacional de Saúde e sobre as prioridades para as ações e serviços públicos de saúde”. Vale abrir um parênteses e lembrar que a saúde pública é (ou deveria ser) um conjunto de medidas executadas pelo Estado para garantir o bem-estar físico, mental e social da população. Na ocasião, o senador disse mais: “os laicistas (os defensores do Estado laico) estão calados, não falaram nada. Recuperação de pessoas drogadas integrados ao SUS? Ali não teve uma vírgula para colocar espíritas, vírgula, católicos, vírgula, evangélicos, vírgula, confissões judaica, islâmica, vírgula, (…) Não! Terreiros de macumba agora vão receber dinheiro do SUS para recuperar pessoas (…). Agora instalou-se, instituiu-se (…). Agora nós temos uma religião oficial?”

Isso porque nas entrelinhas da referida Resolução 715, após 11 parágrafos com a palavra “considerando”, sob a “bênção” do gestor ambiental e presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Fernando Zasso Pigatto, e da socióloga e ministra de Estado da Saúde, Nísia Trindade Lima, o item 46 do anexo II descreve “(re)conhecer as manifestações da cultura popular dos povos tradicionais de matriz africana e as Unidades Territoriais Tradicionais de Matriz Africana (terreiros, terreiras, barracões, casas de religião, etc.) como equipamentos promotores de saúde e cura complementares do SUS, no processo de promoção da saúde e primeira porta de entrada para os que mais precisam e de espaço de cura para o desequilíbrio mental, psíquico, social, alimentar e com isso respeitar as complexidades inerentes às culturas e povos tradicionais de matriz africana (…).”

O anexo II, ainda, se aprofunda em expor “necessidades”, tais como as vistas no item 40 de “atualizar a Política Nacional de Saúde Integral LGBT para LGBTIA+ e definir as linhas de cuidado, em todos os ciclos de vida, contemplando (…) identidade de gênero (…), pessoas intersexo, assexuais, pansexuais e não binárias (…) e integração da Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais”, além de propor “atualização dos protocolos e redução da idade de início de hormonização (mudança de sexo) para 14 anos.” Também, espera-se pela “ampliação de políticas sociais e de transferência de renda, com a legalização do aborto e a legalização da maconha no Brasil”, como descrito no item 49.

Diante de todo o exposto é natural o surgimento de muitos questionamentos, a começar pela considerável politização e certo palanque para agendas inegavelmente ideológicas, com vestígios progressistas. Se ainda restam dúvidas em meio a palavras e termos vistos ao longo da resolução como “patriarcado”, “pessoas que menstruam” – em vez de se referir claramente à mulheres –, legalização do aborto e da maconha e “redução da idade de início para hormonização para 14 anos”.

Mas voltando aos questionamentos, como se daria essa prática? “Considerando” o Brasil como um estado laico, então, por que o berço da laicidade, aqui, só abraça as manifestações culturais e unidades territoriais de matrizes africanas como equipamentos promotores de saúde e cura complementar? Por que não incluir todas as profissões de fé e suas igrejas, sinagogas e mesquitas como espaços de cura? Será que há apenas uma porta de acesso para os mais necessitados? Inegavelmente, a fé tem um papel indiscutível, pois nos dá a condição de recorrer e nos agarrar, muitas vezes, ao único fio de esperança que nos resta. Mas isso pertence a todas as crenças e não a uma isoladamente.

Enquanto o ministério alega que a “resolução se trata de um documento de orientação que faz parte do processo de escuta popular”, se ignora o que é isonomia e outras vertentes. Vale pontuar que o CNS é um colegiado permanente do Sistema Único de Saúde (SUS) que integra o Ministério da Saúde e que a função do órgão, criado há mais de 80 anos, é “fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de saúde nas suas mais diferentes áreas, levando as demandas da população ao poder público”. Interessante, não?

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