Estaríamos vivendo uma epidemia de sofomania?

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“O contexto das redes sociais como amplificadoras de idiotas e pessoas malucas não era o que nós queríamos.” Essa frase foi dita por Eric Emerson Schmidt, presidente da Alphabet, anteriormente denominada Google. Embora não tenha sido o objetivo, tudo indica que o resultado, infelizmente, tem sido esse…

Não importa qual seja o assunto ou a complexidade do tema, os estúpidos estão sempre presentes – principalmente na internet, mas não só nela – oferecendo soluções tão simples quanto inúteis, expressadas sistematicamente em frases pontuadas pela arrogância e, claro, pela ignorância.

Exemplos não faltam, mas citaremos apenas dois para preservar a sanidade mental de nossos leitores (vai que isso pega?): “Por que o governo não divide o prêmio da mega da virada para os 220 milhões de brasileiros? Todos ficariam milionários pelo menos por um tempo.” “O mundo tem 8 bilhões de pessoas e o Elon Musk tem 200 bilhões de dólares. Ele pode matar a fome no mundo inteiro doando 25 mil dólares para cada. Mas, desde quando milionário liga para pobre? Que se danem, né?”

Vamos ignorar o fato de que os prêmios desse tipo de jogo não são pagos com dinheiro do governo, mas sim, dos apostadores (e que os jogos foram criados para dar lucro ao Estado). Segundo a Caixa Econômica Federal, o maior valor pago foi de R$ 306 milhões, em 2017, quando 17 pessoas acertaram as seis dezenas e receberam R$ 18 milhões cada um.

Ainda que consideremos o maior prêmio já pago, ao dividi-lo entre 220 milhões de pessoas, cada um receberia R$ 1,39, montante que, “salvo engano”, não faria de ninguém um milionário. E quanto à divisão da fortuna de Musk, o único mérito da solução “genial” foi a tentativa (ainda que malfadada) de fazer uma operação matemática.

O que talvez explique o fenômeno que faz com que pessoas ignorantes se achem verdadeiros gênios, cuja sabedoria pode salvar o mundo da fome e da pobreza, é a sofomania. Os sofomaníacos são pessoas estúpidas (no sentido de ignorantes), mas que têm certeza de que são extremamente inteligentes.

São pessoas que nem sequer cogitam a possibilidade de estarem erradas, não aceitam opiniões contrárias e classificam quem pensa diferente como alienado, ingênuo, burro ou, em última instância, um coitadinho.

Tenho a impressão de que todos nós conhecemos pessoas assim, logo, não é estupidez pensar que talvez estejamos em meio a uma epidemia (quiçá pandemia) de sofomania. O que ainda não se tem a menor ideia é sobre como será o futuro das sociedades onde o número de sofomaníacos parece crescer a cada dia.

Já dizia Nelson Rodrigues: “Os idiotas vão tomar conta do mundo; não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos.”

* Por Patricia Lages, jornalista e escritora

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Colaborador

Por Patricia Lages, jornalista e escritora / Foto: SIphotography/getty images