“De quem se irá comprar a droga?”

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Nos últimos dias, as drogas entraram no noticiário brasileiro com toda a força mais uma vez. Isso porque o Estado de São Paulo trava uma luta contra elas já há algum tempo na região central da cidade, em um lugar conhecido como Cracolândia. Nas ruas da maior metrópole do País, o governo, por meio da inteligência e de suas forças de segurança, enfrenta o tráfico de drogas e a concentração de usuários de crack. O vício mantém centenas de pessoas vivendo em situação de vulnerabilidade na região e provoca o aumento dos índices de furtos, roubos e agressões. É um verdadeiro caos.

Ao mesmo tempo, o Superior Tribunal Federal (STF) voltou a discutir a descriminalização das drogas, inclusive um dos magistrados que votou favoravelmente disse que é preciso estabelecer um critério para separar uso pessoal e tráfico. O julgamento está em análise na Corte desde 2015 e já têm quatro votos favoráveis: de Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Alexandre de Moraes.

Vários pontos precisam ser analisados nessa decisão, mas um recorte se destaca: um dos magistrados justificou em seu voto, ao se referir à maconha, que “é uma droga mais leve que as demais drogas, isso cientificamente comprovado”. Ou seja, por ser supostamente “mais leve” não haveria problema se for consumida por quem quer que seja. Inúmeros estudos, porém, apontam os impactos da cannabis sativa no cérebro, como problemas de concentração e dificuldades de memorização e aprendizagem, principalmente nos mais jovens.

De acordo com uma pesquisa publicada na revista Addiction, o consumo da maconha afeta negativamente o desempenho educacional dos adolescentes. Já entre os adultos pode estar associada a um desempenho ruim na vida profissional e promover direção perigosa. Mas há algo pior: os especialistas não têm certeza se é possível reverter os danos, que podem variar de acordo com a quantidade, frequência e anos de uso.

Outro órgão que corre sérios riscos é o coração. Um estudo organizado por pesquisadores da Universidade de Medicina da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, mostrou que o componente psicoativo da maconha, o THC, pode desencadear inflamação nas células que revestem os vasos sanguíneos e provocar aterosclerose (obstrução nas artérias que nutrem o coração).

Além dos prejuízos à saúde, mais um aspecto da descriminalização da maconha para uso pessoal que merece atenção foi apontado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco: “ao se permitir ou ao se legalizar o porte de drogas para uso pessoal, de quem se irá comprar a droga?

De um traficante de drogas, que pratica um crime gravíssimo equiparado a hediondo”. Logo, a decisão da Suprema Corte pode ser considerada contraditória, afinal será como tentar conter o tráfico de um lado e estimulá-lo de outro.

É preciso considerar ainda que essa discussão, apesar de ser inédita no Brasil, já aconteceu em outros países e os resultados não foram animadores. Na Holanda, por exemplo, a flexibilização do consumo de drogas aconteceu em 1976, com a descriminalização da posse e venda da maconha. O efeito disso foi o aumento do consumo da droga no país e, consequentemente, da dependência, que é um dos caminhos para se procurar entorpecentes cada vez mais fortes. O Uruguai também adotou uma postura mais flexível em relação à maconha e a consequência foi semelhante: elevação do número de usuários, fortalecimento do mercado ilegal e aumento no número de casos de violência ligados ao narcotráfico.

Vale ainda destacar o caso do Estado norte-americano de Oregon, que, depois de uma consulta pública em 2020, descriminalizou o porte de pequenas quantidades de maconha e outras drogas. O resultado foi o aumento no número de adictos e de pessoas que vivem nas ruas. Segundo dados da Administração de Serviços de Saúde Mental e Abusos de Substâncias, duas pessoas morrem por dia no Estado em razão de overdose.

Esses são alguns danos visíveis das drogas na vida de uma pessoa, mas, além deles, há uma série de outros impactos negativos, como problemas familiares, financeiros, na vida profissional e até mesmo com relação à expectativa de vida e de futuro. Será que é isso que queremos para o Brasil? Sabemos que o tema é sensível e complexo e que precisa ser avaliado com muita cautela e de preferência no Congresso Nacional.

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Colaborador

Redação / Foto: José Antonio Luque Olmedo/getty images