Solidão: o resultado de pouca conexão com a vida
Condição afeta os relacionamentos e pode prejudicar a saúde física e mental
Em meio a toda agitação proposta pelo mundo atualmente, tem sobrado pouco tempo para viver verdadeiramente em sociedade, ou seja, notar o próximo, trocar experiências, dividir histórias e ampliar os horizontes. Enquanto sobram compartilhamentos on-line, a vida real carece de atenção e as pessoas não estabelecem conexão com outras, o que tem elevado a sensação de solidão mundo afora.
Inúmeras pesquisas, inclusive anteriores à pandemia de covid-19, já apontavam para uma epidemia silenciosa de solidão. No Reino Unido, por exemplo, uma pesquisa de 2018 encomendada pelo governo revelou que cerca de 9 milhões de pessoas se sentiam sozinhas, com destaque para 200 mil idosos que estavam sem conversar com um amigo ou um familiar havia mais de um mês. Já no Japão, um levantamento feito no mesmo ano mostrou que aproximadamente 20% dos jovens com idades entre 13 e 29 anos não tinham com quem conversar sobre os seus conflitos pessoais.
O cenário, que já era preocupante, se agravou de forma significativa durante a pandemia. Com o isolamento social, a recomendação de evitar o contato com terceiros e ficar em casa, conversar pela internet se transformou na forma mais comum de comunicação.
Um estudo feito pela consultoria Ipsos em 2021 durante a pandemia ouviu pessoas em 28 países, sendo mil brasileiros, e revelou que o Brasil estava em primeiro lugar no ranking de pessoas solitárias. Cerca de 50% dos entrevistados afirmaram se sentir solitários. Em seguida, aparecem os turcos (46%) e os indianos (43%).
O problema é que, mesmo com o fim do período pandêmico, ainda há dificuldade de retomar uma rotina saudável, apoiada principalmente em conexões verdadeiras. Essa realidade afeta todas as faixas etárias, mas especialmente os jovens. Nos Estados Unidos, estima-se que nas últimas duas décadas o tempo destinado por eles aos amigos foi reduzido em 70%. A informação é do relatório Our Epidemic of Loneliness and Isolation 2023 (Nossa Epidemia de Solidão e Isolamento, em tradução livre), divulgado pelo Conselho do CirurgiãoGeral dos Estados Unidos, a autoridade máxima em saúde pública do país.
“Nunca houve tanta oferta de tecnologia para se comunicar como hoje, mas, ao mesmo tempo, muitos jovens têm dificuldade de fazer a verdadeira comunicação, que não acontece usando os dedos ou o fone de ouvido, mas com a mente e com a boca, ao olhar nos olhos e falar com os pais”, explicou o Bispo Renato Cardoso na palestra da Terapia do Amor realizada em 5 de outubro.
A comunicação, principalmente entre pais e filhos, pode poupar os adolescentes de muitos sofrimentos fora de casa, como o bullying. “Quando o jovem não se comunica com pessoas que querem o seu bem, normalmente ele aguenta muita coisa. Então, ele tem um problema na escola e deduz que a mãe, o pai, o professor ou o irmão não vão entender. E, sem a comunicação, o jovem vai aguentando, o que é muito perigoso, pois ele aceita coisas que não deveria aceitar”, disse Cristiane Cardoso.
Dessa forma, muitos optam pelo isolamento: se escondem no quarto, nos jogos e na internet e deixam de aprender a se comunicar com as pessoas e de buscar apoio para superar as dificuldades. Ocorre que estar nessa condição pode causar uma série de danos físicos e mentais.
O impacto da ausência
Mais do que o contato físico ou a troca de palavras, uma conexão verdadeira entre as pessoas acontece por meio de uma entrega, uma espécie de valorização do próximo que é percebida por meio de atitudes. Assim, a falha desse relacionamento tende a mexer com o aspecto sentimental de um indivíduo. “A solidão é um sentimento de não pertencimento e independe de ter ou não alguém por perto, ou seja, a pessoa pode estar cercada de pessoas e mesmo assim sentir solidão”, explica a psicóloga Lilian Neves.
Além do excesso de tecnologia e do ritmo frenético do mundo atual, Lilian diz que outros fatores podem estimular o desenvolvimento do sentimento de solidão, como a insegurança. “Ela leva ao isolamento e impede o indivíduo de fazer amizades, de se incluir em um grupo e de socializar com as pessoas ao seu redor. Essa insegurança pode ter muitos motivos, até mesmo físicos, quando a pessoa não se sente compatível com o padrão que ela acha que a sociedade exige”, diz. Ela acrescenta que crescer em um lar disfuncional ou perder pessoas próximas também podem levar à solidão.
Na prática, quanto mais longe das pessoas, menor é a habilidade de conviver com as diferenças do próximo. “As pessoas que perderam o hábito de lidar umas com as outras, quando necessitam, acabam não tendo paciência ou partem até mesmo para a agressão”, esclarece.
O impacto desse sentimento pode ser tão intenso que afeta o corpo e a mente. “Pesquisas revelam que a solidão severa pode causar doenças e até morte prematura. Dentre os impactos físicos estão doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, demência, obesidade mórbida e pressão alta. Já entre os impactos emocionais podem ser citados a baixa autoestima, ansiedade, depressão, síndrome do pânico e fobia social”, destaca Lilian. Em casos mais graves, o indivíduo pode ser bombardeado por pensamentos de morte.
Saindo da rotina
Mudar esse quadro depende de alguns fatores, inclusive do esforço de reconhecer a solidão e desejar sair da zona de conforto que ela oferece. “É importante ter equilíbrio e dar espaço na vida, na medida adequada, nem mais, nem menos, às coisas que são importantes. Jogar é bom, estar com os amigos é bom, sair de casa e ver como está o mundo lá fora é igualmente bom”, esclarece Lilian.
Ela também deixa uma orientação para os adultos: “se você percebe que está vivendo esta solidão, tente entender o que pode estar acontecendo com você e está colocando as pessoas a distância? Quais são seus medos? Entre em contato com eles. Você só pode lutar contra aquilo que conhece, ou seja, você toma consciência e, assim, se dá a chance de vencer a solidão”.
Vale destacar a importância de fortalecer o aspecto espiritual na luta contra a solidão. Como citado anteriormente, o sentimento não está ligado a fatores externos necessariamente, mas, principalmente, a questões internas. E quem melhor do que o próprio Criador para apontar as deficiências de cada um e orientar quanto ao que precisa ser mudado? Além de fortalecer as relações interpessoais, que tal investir na conexão íntima com Deus? Ele estará presente em sua vida 24 horas por dia, preenchendo qualquer espaço outrora ocupado pela solidão.
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