Uma prisão chamada nomofobia
O medo irracional de ficar sem o celular ou seus serviços está cada vez mais presente em nossa sociedade, a ponto de um termo específico para defini-lo ter sido incluído no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa
O celular se tornou uma extensão do ser humano e está presente em nossa vida desde o momento que abrimos os olhos de manhã até quando nos deitamos para dormir. Para alguns, ele atua como uma espécie de oxigênio e pensar em ficar sem ele no dia a dia pode causar pavor e até desencadear ansiedade ou outras reações psicológicas. Esse medo constante e, muitas vezes, irracional, além de denotar uma dependência séria, também pode indicar um distúrbio que, embora não faça parte oficialmente do quadro de diagnósticos da comunidade médica, é mundialmente reconhecido como um transtorno comportamental: a nomofobia.
Um mal digital
A palavra nomofobia se originou da junção dos termos em inglês “no-mobile-phone-phobia” e foi incluída ao Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP), da Academia Brasileira de Letras. Sua definição é “medo patológico de ficar sem acesso ao smartphone e seus serviços (internet, redes sociais e aplicativos), entre outros dispositivos eletrônicos, como computador ou tablet”.
Segundo levantamento da organização SecurEnvoy, desde 2012, 66% da população global convive com o transtorno, sendo 77% jovens. Apesar dos altos índices, a tendência é que os casos de dependência digital aumentem ainda mais à medida que a tecnologia avance. A psicóloga clínica Renata Santana explica por que isso deve ocorrer: “Ninguém mais consegue imaginar a existência sem o uso do celular. Ele tornou-se necessário e útil, é a principal fonte de comunicação entre as pessoas e, de fato, traz facilidades incríveis e indispensáveis, mas o avanço tecnológico interfere diretamente nas nossas relações e nas estruturas da sociedade. Por meio das redes sociais, cria-se um mundo, um metaverso, que nos fascina e retira de nós a possibilidade de gerenciar nossa própria vida e explora paixões e dinâmicas compulsivas”.
Entre essas práticas compulsivas, ou seja, repetitivas e incontroláveis, relacionadas à busca por prazeres e recompensas geradas pela nomofobia, estão o monitoramento frequente de notificações em momentos inadequados, como na hora de comer ou de dormir; a preocupação contínua com o nível da bateria do celular ou com a rede de conexão com a internet; o medo de esquecer o aparelho; e a apreensão de perder informações e eventos quando estiver off-line. De acordo com Renata, esses hábitos podem resultar em prejuízos para a convivência real e, consequentemente, ao bem-estar do usuário, pois estimulam o adoecimento físico e mental: “O uso excessivo do celular ataca exatamente a qualidade das nossas relações afetivas mais próximas. A nomofobia também afeta diretamente a saúde mental, com o surgimento de ansiedade, depressão, isolamento, angústia, irritabilidade, medo, estresse, crises de pânico, solidão e insônia. Já no que se refere à saúde física, observamos desde o sedentarismo até sintomas como falta de ar, náuseas, tontura, tremores, aceleração da frequência cardíaca, fadiga ocular, enxaqueca, dores pelo corpo e síndrome do túnel do carpo (compressão no nervo da mão)”.
É preciso equilíbrio
Os efeitos causados pela compulsão pelo uso de aparelhos eletrônicos são totalmente prejudiciais ao desenvolvimento de qualquer ser humano, mas, como reforça Renata, a nomofobia pode ser evitada: “É possível prevenir os seus impactos com o uso consciente do celular. Se não o fizermos, correremos sérios riscos de desenvolver dependência comportamental, emocional e psicológica. Esses vícios graves podem nos levar a sacrificar toda uma vida real para ficar absorvido, hipnotizado diante de uma tela, em uma realidade paralela que nos retira o sentido de viver”.
Renata alerta que o indivíduo com nomofobia precisa procurar tratamento psicológico, que o auxiliará a fazer o processo de desconexão profunda com o celular. Outra alternativa de prevenção é preencher o tempo que seria utilizado para incitar esse vício aplicando seus esforços para fortalecer e manter uma conexão íntima com Deus e Sua Palavra, visto que aqueles que investem na Fé não se deixam seduzir pelas armadilhas que conduzem à nomofobia e aos seus efeitos negativos.
Ela lembra que, sem receber os cuidados necessários, não será possível driblar o transtorno: “Podemos ter a ilusão de que somos racionais e prudentes, mas, antes de acessar essa capacidade cognitiva, somos guiados por nossos impulsos inconscientes e podemos nos tornar reféns do medo. Enquanto não formos capazes de perceber o que nos guia e controla, permaneceremos manipulados e não estabeleceremos nenhuma resistência”, conclui.
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