Morador de rua grita por socorro e é ignorado

Por que ninguém ouviu o pedido de ajuda de Carlos de Magalhães?

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Nos últimos anos, Marlene Flauzino, vivia atrás do filho, Carlos Eduardo Pires de Magalhães (foto abaixo), de 40 anos, que saiu de casa para viver nas ruas por conta do vício em crack. Quando o encontrava o levava de volta para casa, mas não demorava muito para ele retornar à vida nas calçadas.

Ele faleceu na manhã do último sábado, no Rio de Janeiro. Mas, antes de sua morte, entrou em uma padaria e pediu ajuda. Ninguém o ouviu.

O mais triste é que mesmo com ele lá caído, já morto, aparentemente todos seguiram sua rotina de café da manhã. Isso mesmo… até seu corpo ser recolhido, as pessoas continuaram comendo e bebendo.

A verdade é que ninguém o notou. Aos olhos de muitos ele foi apenas mais um viciado que morreu.

Vidas que imploram por atenção

A história de Carlos será esquecida daqui a alguns dias, mas sua morte representa a realidade das pessoas que vivem hoje em situação de rua.

Há alguns anos, lembro-me que era uma quinta-feira à noite e fazia frio na capital, conversei com algumas pessoas que estão nessa condição. Esse dia me marcou muito porque conheci homens e mulheres que contaram como e por que foram parar nas ruas…

Uma jovem, de 23 anos, que estava grávida, me contou que sua mãe a teve em um presídio e, logo após que nasceu, foi encaminhada a um abrigo. “Não aguentei e fugi. Mas, definitivamente, essa vida que levo não é a que quero para criar meu filho”, disse.

A realidade de quem mora nas ruas é dura. Frio, fome, doenças e discriminação são apenas algumas das dificuldades enfrentadas. E, quando se fala nas mulheres, os problemas aumentam. Sem proteção, elas são vítimas da violência decorrentes de agressões físicas, estupros e ataques sexuais. Por conta disso, acabam vivendo péssimas experiências, como uma gravidez indesejada fruto de abuso, envolvimento com drogas, entre outras, o que faz com que a possibilidade de mudar de vida se torne cada vez menor.

Outra história que me marcou foi a de um homem, de 40 anos, que, com lágrimas nos olhos e uma voz engasgada, me contou que a vida financeira difícil o fez ir morar nas ruas.  “Era técnico em eletrônica, sei instalar sistemas de segurança, mas, por conta do vício em álcool perdi o emprego, depois o lar e estou aqui nas ruas. Sou viciado, mas quero uma nova vida, uma nova chance”.

Quando uma oportunidade salva

Ao contrário do que muitos pensam, muitos que vivem em situação de rua abusam de substâncias químicas para esquecer a dor de não ter onde morar. Assim, o uso de drogas, por vezes, é a consequência da situação e não ao contrário.

A população em situação de rua cresceu 140% a partir de 2012, chegando a quase 222 mil brasileiros em março deste ano, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Mas, especialistas acreditam que esse número pode ser muito maior.

Infelizmente, essa lacuna de dados prejudica a implementação de políticas públicas voltadas para este contingente e reproduz a invisibilidade social no âmbito das políticas sociais.

Eu não consigo acreditar que uma pessoa decida viver nessas condições em sã consciência. A rua é o lugar da insegurança, da delinquência, do medo e do anonimato social.

Os especialistas explicam que muitas pessoas, quando têm uma oportunidade real de ressocialização, abandonam os vícios e as ruas. Eu vivenciei isso de perto. Como esse tema sempre me chamou atenção, participei de ações sociais e tive a linda oportunidade de conhecer pessoas que mudaram de vida. A ideia de doar alimentos, roupas, cobertores e, principalmente, palavras de fé e motivação auxilia no resgate de milhares de pessoas.  

Claro que há também aqueles que não querem receber ajuda e, por conta dos vícios, são agressivos… Mas, há muitos outros que precisam e querem um socorro.

Por isso, acredito que é preciso que haja uma mudança de olhar e uma conscientização de que, por trás de cada morador de rua há uma história triste de vida que não foi superada.

Olhar para essas vidas com indiferença e julgamentos só piora a situação. Por isso, cada um, em seu universo individual, pode fazer um pouco, ainda mais nesse período de pandemia, onde a população em situação de rua está esquecida, sem comida e sem condições de manter a higiene recomendada pelo Ministério da Saúde.

* Para ler mais reflexões como do blog Refletindo sobre a notícia por Ana Carolina Cury clique aqui.

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Colaborador

R7 / Refletindo sobre a notícia por Ana Carolina Cury