Quem paga a conta do crime em Mariana?

Moradores apresentam contaminação por metais pesados e problemas de saúde

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Sofya Marques tem 3 anos, mas carrega as marcas da lama desde os primeiros meses de vida. Há dois anos e cinco meses está doente, com o corpo cheio de caroços, cabelos caindo e febre constante. Nos últimos meses, passou a ser levada para a escola carregada, pois não consegue andar por causa de fortes dores nas pernas.

A mãe dela, Simone Silva, acredita que a situação de Sofya se agravou com a poeira da lama e os rejeitos reaproveitados nas calçadas, que impactaram a saúde dos moradores de Barra Longa (MG).

Sofya é uma das 11 pessoas que foram submetidas a exames pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade, para dimensionar o impacto do desastre ambiental na saúde dos atingidos. As amostras de sangue foram coletadas e enviadas ao Laboratório de Toxicologia e Essencialidade de Metais da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto. O resultado revelou excesso de níquel no sangue dos 11 participantes, carência de zinco em 10 deles e três têm aumento de arsênio no organismo.

Os examinados são moradores de Barra Longa (a 60 quilômetros de Mariana), uma das cidades invadidas pela lama em 2015, quando a barragem do Fundão, operada pela empresa Samarco, se rompeu e despejou rejeitos de minério de ferro, que percorreram 663 quilômetros e atingiram 39 municípios situados entre Minas Gerais e Espírito Santo.

Segundo Letícia Oliveira, coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens, os resultados de Barra Longa são um alarme para entender a contaminação. “Há indícios de que a maior contaminação esteja no ar e na poeira dos rejeitos espalhados pelas cidades.”

Os moradores contam que a Samarco espalhou lama pela cidade em forma de asfalto e fez depósitos nos bairros mais pobres e nos morros. As consequências não tardaram a aparecer. Exemplos disso são os casos de Andrea Domingues, Taynara Barreto e Sofya Marques. Andrea tem excesso de níquel no sangue e já sofreu um AVC por complicações, Taynara Barreto tem excesso de arsênio e níquel e Sofya tem excesso de níquel. As três moradoras têm déficit de zinco.Todas elas têm sintomas parecidos: fortes dores de cabeça, náuseas, alergias e falta de ar. Os sintomas se repetem em vários moradores da bacia de Rio Doce – um alerta de risco de contaminação para outros 36 municípios de Minas Gerais.

Em nota, a Fundação Renova, instituição mantida pela Samarco para ajudar os atingidos pelo desastre, esclareceu que mantém permanente diálogo com especialistas e autoridades. “A organização está empenhada em avaliar os eventuais riscos à saúde humana decorrentes do rompimento da barragem de Fundão e, em um novo esforço para investigar a situação, dentro de uma série de estudos epidemiológicos e toxicológicos em toda a área impactada, abriu uma chamada técnica.”

Onde está o apoio?

A recomendação médica para Sofya e Taynara é abandonar Barra Longa e começar um tratamento, mas suas famílias não têm recursos para isso. Elas e Andrea sofrem a mesma exclusão: não são reconhecidas pela Renova como vítimas, pois são moradoras do morro e a lama não destruiu suas casas. Consequentemente, não recebem ajuda econômica e o apoio para a saúde é escasso.

Enquanto a Renova garante que está se mobilizando, os atingidos lutam pelo direito à saúde, informação, ao trabalho digno e à moradia. Porém nada muda e a conta continua sendo paga pelas vítimas e não pelos autores do crime.

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Colaborador

Por Katherine Rivas/ Foto: Reuters