Quem combate a intolerância?

No mundo “moderno”, o preconceito contra ideais cristãos, por exemplo, não é apenas tolerado, mas também incentivado

Imagem de capa - Quem combate a intolerância?

Conhecida por seu discurso contra intolerância, Joy Behar, uma das apresentadoras do programa americano The View (talk show com posicionamento de esquerda), da emissora ABC, já foi elogiada pelo site gay NewNowNext por ser incisiva no combate ao preconceito contra homossexuais. Em entrevista ao site, afirmou:

“Recebo muito feedback positivo da comunidade gay. Mas eu falaria a mesma coisa sobre negros, judeus e qualquer um que eu achasse que estivesse sendo discriminado”. E, de fato, ela protagonizou uma reação explosiva no programa ao se indignar contra um entrevistado, o jornalista Bill O’Rilley, por ter dito: “muçulmanos mataram americanos no 11 de setembro”, defendendo a mudança de endereço de uma mesquita próxima ao local dos atentados.

Ao ouvir a frase, Joy, revoltada, levantou-se abruptamente, aos gritos, e saiu do set de filmagem. Ao voltar para o palco, exigiu que ele se retratasse. Segundo Joy, O’Rilley deveria usar o termo “terroristas” em vez de citar a religião (ainda que a religião fosse essencial ao contexto, afinal, o assunto era uma mesquita).

No entanto, no dia 13 de fevereiro, contrariando seu próprio discurso Joy comparou cristianismo a uma doença mental ao comentar sobre o vice-presidente, Mark Pence. Em suas palavras: “uma coisa é falar com Jesus, outra é Jesus falar com você. Isso se chama doença mental”. A repercussão negativa veio majoritariamente de cristãos que se sentiram ofendidos e exigiam retratação. Inicialmente, Joy e as outras apresentadoras tentaram diminuir a importância da ofensa, dizendo que foi apenas uma brincadeira e invocando liberdade de expressão. Apenas em 13 de março, depois de um mês inteiro e mais de quarenta mil telefonemas de cristãos para a emissora e anunciantes do programa, o fraco pedido de desculpas finalmente veio.

Por que alguém aparentemente tão sensível à intolerância, não teve a mesma sensibilidade para ver o erro em seu comentário? A postura de Joy Behar reflete a hipocrisia do discurso de quem afirma ser contra o preconceito, mas que, na prática, só se revolta contra o que lhe convém. Intolerância, para essas pessoas, só é intolerância quando atinge suas pautas.

No mundo “moderno”, o preconceito contra ideais cristãos, por exemplo, não é apenas tolerado, mas também incentivado. Cristãos podem ser ridicularizados, ofendidos, chamados de burros, idiotas e doentes mentais. Podem ser alvo de piada nas redes sociais e de achincalhamento na mídia tradicional pelos mesmos grupos que vestem a fantasia do “combate à intolerância” quando a pauta é referente a outras religiões e minorias. Quando alguém se ergue para apontar a ofensa, é novamente agredido: “não é intolerância”! Gritam. Ou, como Behar, apelam à “liberdade de expressão”. Se sentem que o que dizem é verdade, não enxergam intolerância.

No fundo, são covardes. Agridem o grupo que sabem que não vai revidar à altura. Calam-se diante de verdadeiras atrocidades, como as leis religiosas que infringem direitos humanos em países árabes, mas a tudo aquilo de que discordam, enxergam com a sensibilidade de uma marreta e a racionalidade de uma alface.

É fácil perceber o problema. É só substituir “cristãos” por qualquer outro grupo e imaginar as reações. Se um jornalista afirmasse algo como: “um rapaz acha que é uma moça? Isso se chama doença mental” ou “muçulmano diz que a mulher precisa cobrir a cabeça? Isso se chama doença mental”. Duvido que esperasse a ofensa fazer aniversário para, finalmente, pedir desculpas.

E quem permitiria a um jornalista difundir as ideias do médico americano do século 19 Samuel A. Cartwright, que defendia que uma doença mental fazia os escravos negros fugirem dos seus senhores? Segundo ele, a tal doença tinha até nome: drapetomania. Já pensou alguém dizer que um negro que luta por seus direitos hoje é doente mental?

A intolerância é a raiz do racismo, da homofobia, da misoginia, da xenofobia, do preconceito religioso e de todas as atitudes de ódio que esses grupos dizem combater. Quem quer realmente lutar por justiça deveria erguer a voz contra qualquer tipo de intolerância, inclusive tendo coragem de confrontá-la em si mesmo. Só seria possível levar a sério quem dá chilique ao ouvir a religião de um terrorista religioso se essa pessoa monitorasse seus pensamentos a respeito de qualquer outro grupo, para evitar comentários preconceituosos. Ou, pelo menos, se pedisse desculpas imediatamente ao ofender alguém. Indignação seletiva é hipocrisia generalizada.

Se você realmente quer ser justo, faça um teste. Quando encontrar algum discurso agressivo contra qualquer grupo que você não defenda, mesmo que concorde com o que foi dito, substitua mentalmente por um grupo que você defenda. Assim, conseguirá ter real noção da agressividade — e do seu próprio preconceito.

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Colaborador

Vanessa Lampert / Foto: Reprodução do Facebook