Amor pelo próximo: verdade ou simples teoria?

Até que ponto alguém pode se dizer cristão e não cumprir este tão importante mandamento?

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Muito se fala em solidariedade nos momentos em que acontecem tragédias. Recentemente, chamou a atenção do mundo como pessoas se mobilizaram para ajudar vítimas do incêndio da Grenfell Tower, em Londres, na Inglaterra. E de outras que prestaram socorro aos feridos no atentado terrorista ocorrido no show da cantora Ariana Grande, em Manchester, no mesmo país.

Claro, ser solidário nessas horas é de suma importância para os que foram atingidos. Mas quantos, na verdade, se dispõem a isso? Quantos realmente se importam com o sofrimento alheio, fazem uso da empatia, que é colocar-se no lugar de outros para entender seu sofrimento?

Há ainda outra questão: será que é preciso acontecer algo trágico para se importar com quem nos cerca ou com quem nem conhecemos? Quantos pensam nos semelhantes em situações cotidianas e poderiam melhorar o dia de muita gente com boas e respeitosas atitudes?

Ajudar, mesmo sofrendo

Há quem leve tanto em consideração o fato de se importar de verdade com a vida e o destino do próximo que chega a ponto de relevar seu próprio sofrimento em prol de quem precisa. O bispo Luis Carlos Gomes (foto ao lado), responsável pelo grupo de Evangelização (EVG) da Universal, tem uma história impactante a respeito disso, protagonizada por ele mesmo.

Ele conta que chegou à Universal como a maioria chega: “sofrendo, amargurado, triste, pensando até em suicídio”. No entanto, perseverou e seguiu um caminho vencedor, porém árduo, “uma trajetória forte, de lutas, batalhas, dificuldades, mas de vitórias”.

O fato de ter saído de um caminho perigoso e ter alcançado a Salvação inspirou o bispo Luis a ajudar milhares de outros a alcançarem o mesmo destino. O trabalho de evangelizar consiste, antes de tudo, em ganhar almas para Deus, impedindo que elas sigam rumo à perdição. Quem melhor para mostrar a uma pessoa que sua vida não é irrelevante do que alguém que já esteve no “fundo do poço” e hoje é uma nova pessoa física, psicológica e mentalmente? E, como o bispo disse, as batalhas não foram poucas nem fáceis.

Há alguns anos, ele e sua família passaram por um desses desafios da vida. Ele já era pastor e sua esposa, Valéria, estava para dar à luz a segunda filha do casal.

Quando faltavam cinco minutos para Luis Carlos iniciar uma reunião, com pessoas que chegavam à Universal como ele, desesperançadas, no pior momento de suas vidas, um pastor veio com a pior notícia possível naquele momento: sua filha tinha nascido natimorta.

O impacto não foi pequeno. Naquele momento, o bispo pensou na esposa, no hospital, que precisava de apoio. Ele mesmo estava triste, obviamente. O colega o encorajou: “Vá lá dar apoio à sua esposa”, disse. “Mas faltavam cinco minutos para a reunião. E aí?”, questionou o angustiado marido e pai.

“Vou fazer a reunião”, decidiu. “Depois vou ao hospital. Há gente morta espiritualmente lá embaixo na igreja precisando de mim. Se elas vieram nesse horário, foi porque Deus as mandou, e essa reunião sou eu quem faz.”

Mesmo em plena dor, quem via o então pastor no Altar não a percebia. “Quem olhava, pensava: ‘esse aí não tem problemas’”, considera o bispo. “Só usando a fé mesmo para tirar pessoas da dor delas sem deixar transparecer a nossa.”

Se o leitor está pensando “e quanto à esposa?”, ela mesma conta: “Quando aconteceu, fiquei aflita, mas o Espírito Santo me consolou de tal forma que é algo que não temos como explicar. É algo de Deus mesmo, que vem do Alto. Houve paz!”, revela Valéria.

O marido concorda, explicando o benefício de se ter uma sólida estrutura espiritual numa hora ruim como aquela: “Por maior que seja nossa dor, temos a Salvação, a certeza da vida eterna, a paz. Deus é grande, maior que os obstáculos, e Ele está sempre conosco”.

A lembrança é triste, como não poderia deixar de ser, mas vem acompanhada de um contentamento genuíno, bem evidente nas expressões dos dois, por terem tomado a decisão certa. “Faria tudo de novo”, diz o bispo Luis, referindo-se não só àquele momento difícil, mas a toda a sua trajetória na Universal.

Aprender na fé

Para alguns, a solidariedade era assunto ausente. Mas a vivência em Deus trouxe um aprendizado que fez diferença não só em suas vidas como despertou o franco desejo de ajudar outras. É o caso de Mislaine de Figueiredo Souza (foto ao lado), de 21 anos, recepcionista em São Paulo, como ela mesma explica: “Antes de conhecer a Deus, eu não me importava com ninguém, somente pensava em mim mesma, principalmente pelas vezes que me maltrataram. Cheguei à Universal com o pensamento ‘Deus precisa de mim, não eu dEle’. Enquanto mantinha isso, minha visão não mudava”.

Mislaine relata que uma colega a convidou para uma reunião da Força Jovem Universal (FJU), porém ela recusou. “Eu disse que não iria e seria melhor ela não ir também. A menina sofria com problemas de saúde, entre eles a epilepsia, e tomava remédios controlados. Eu não quis levá-la e os problemas só se agravaram.”

A verdade é que a moça ainda não tinha tido um Encontro com Deus e por isso não reconheceu a importância de levar aquela jovem até Ele. “Diversas vezes presenciei aquela amiga desmaiada na minha frente. E aquilo começou a mexer comigo, pois algo estava mudando em mim.”

Ela afirma que a mudança veio quando algo dentro dela mudou. “Meu pensamento mudou com relação às pessoas depois que neu interior foi mudado, quando reconheci que precisava de Deus para ajudar as pessoas e que eu mesma, sozinha, não era capaz. Deixei de só pensar em mim. Dali em diante tive a transformação do meu interior e vi que não podia deixar de passar às pessoas aquilo que recebi.”

Graças a Deus, mesmo sem a ajuda dela, a amiga encontrou o socorro de que precisava. “Minha amiga foi curada depois, com a ajuda de outros que a levaram à fé. Mas aquilo tudo me ajudou a abrir os olhos. Passei a ver as pessoas de outro jeito. Tudo mudou quando conheci de fato o Senhor Jesus e a Fé.”

“Traída” pela correria

Diferentemente de Mislaine, outra paulistana não era vítima do egoísmo. Ainda assim, também aprendeu no exercício da fé a se aprimorar no amor pelo próximo.

A jornalista de formação Deise Alves da Silva Lopes (foto ao lado), de 35 anos, é das que sempre procuraram ajudar pessoas “e até animais” de acordo com suas condições quando nem conhecia a Deus ainda. “Sempre tive opinião formada em relação a ajudar o próximo em tudo que posso. Não existiu um ‘antes e depois’”.

Ela acrescenta: “Posso dizer que tive exemplos em minha própria casa. Se tenho dois, posso dar um. Se tenho apenas um, posso compartilhar, pois mesmo assim continuo tendo mais do que aquele que não tem nenhum. De qualquer forma, vale frisar que, todas as vezes que ajudo alguém, procuro passar a ‘receita’ de como não viver apenas na dependência de outros, pois não é sempre que podemos contar com alguém”.

Deise conta que nem sempre conseguiu fazer o bem aos outros. “Eu não diria que houve um momento em que eu não quis ajudar, diria que fui ‘traída’ pela correria do dia a dia. Me lembro de um dia em que eu estava com pressa no retorno para casa, já era tarde e não poderia perder o horário da condução. Me deparei com um pedinte estendendo a mão em busca de algum alimento e naquele dia eu possuía um pacote de bolachas na bolsa, mas passei correndo. A imagem daquele homem ficou por dias na minha mente. Confesso que não costumo ajudar com dinheiro, mas não nego o alimento ou algo material que esteja ao meu alcance.”

A jornalista explica que ajudar seu semelhante é questão de consciência e disposição. “É necessário cuidar do próximo, independentemente das circunstâncias. Não ajudo por interesse, é uma questão de dar sem esperar, porém, vivo em minha vida o fruto de tudo que tenho plantado. Posso afirmar que tudo que fazemos nessa Terra de alguma forma volta para nós, como uma semente que lançamos ao solo. Plantamos apenas uma, mas o fruto vem multiplicado dezenas de vezes.”

De onde vem a capacidade

Bispo Luis Carlos, Mislaine, Deise. Três casos diferentes na origem. No entanto, iguais no sentido de que a proximidade com Deus nos faz ver as pessoas com Seus olhos, de uma perspectiva de que somos responsáveis pelo bem-estar uns dos outros. O bispo aprendeu na prática que andar conforme a vontade de Deus nos fortalece para os “trancos” da vida. Mislaine não é mais escrava de seu ego ferido. Deise aprendeu que podemos conseguir tempo para ajudar quem precisa, por mais ocupados que sejamos.

O poderoso cotidiano

Mas, como perguntamos no início, é mesmo necessária uma tragédia para interagirmos de uma forma espiritualmente relevante em favor dos semelhantes? Não. Em atitudes simples do dia a dia também podemos fazer diferença. Mesmo as que parecem as mais comuns, sem importância.

De nada adianta ser um catedrático de Bíblia, um especialista na Palavra, se a pessoa não a vive. Não que haja algo errado em aprender tudo o que for possível sobre as Escrituras. Pelo contrário, é excelente e necessário. O que está errado é não colocá-la em prática.

De que adianta ser um doutor em Bíblia se não sabemos nos comportar em relação ao nosso familiar, vizinho, colega ou até com pessoas que nem conhecemos e encontramos sempre no metrô, no ônibus, no automóvel ao lado do nosso, na sala de espera de um consultório, no elevador, na calçada…

Ser cristão não combina com falta de educação, pois ela desperta antipatia e quem está de fora passa a rotular todos os que frequentam a sua igreja se você é grosseiro. É o que você quer? Parou para pensar que o “Eu sou a Universal” não é só propaganda? Você também a representa, assim como a Deus, onde quer que esteja.

Questão de sobrevivência

Sem união, não há vida em comunidade, o que implica não só regras de boa convivência, mas qualidade de uma existência física, psicológica e espiritual. E isso se consegue no campo social, ainda que depois de algo mudar dentro de você, como os testemunhos apresentados. É disso que fala Thaís Quaranta, psicóloga especialista em neuropsicologia, de São Paulo. “A prática de se mostrar solicito e solidário em pequenas situações no dia a dia pode ajudar quem a recebe a entender a importância dessas ações em sua vida e como poderiam fazer para que se propagassem.”

A psicóloga compartilha uma experiência pessoal que teve ao ajudar um colega de trabalho. “Eu tive um retorno positivo de uma colega psiquiatra. Em uma de nossas conversas, ela contou que, na época em que foi contratada, estava um pouco insegura pela novidade do lugar e das pessoas. Logo no primeiro dia, cruzamos no café e eu puxei papo, fechando a conversa com um ‘seja muito bem-vinda, doutora’. Algo que talvez fosse usual para mim. Eu nem havia percebido o que a ação causou. Mas, para ela, que me contou um ano depois, minhas palavras fizeram muita diferença, pois a partir dali começou a se sentir mais acolhida pela equipe.”

A especialista ainda comenta a diferença entre ser educado e de fato ter empatia com o outro. “Boas maneiras são comportamentos que podem expressar respeito, mas não necessariamente estão ligadas à empatia. Quando a pessoa age por causa das regras de etiqueta, não há afeto, não há cuidado, não há amor. A gentileza seria mais do que isso. Sobretudo, tem a ver com o desejo de ajudar o mundo a se tornar mais humano e eficiente para todos.”

É importante frisar que ajudar o outro tem que nascer de um desejo genuíno, de uma boa intenção e sem esperar nada em troca, como disse Deise. Pessoas que fazem o bem em busca de aplausos acabam frustradas porque nem sempre terão o reconhecimento do outro. Ou acabarão por fazer apenas o que chame atenção, como comenta Thaís Quaranta. “Nem todas as boas ações são reconhecidas pelo outro. No entanto, é cientificamente comprovado que as pessoas que as praticam tendem a experimentar emoções mais positivas, aumentando a liberação de neurotransmissores no cérebro ligados à sensação de prazer e bem-estar. Dizem que a sensação de quem pratica o ato geralmente é maior do que a de quem o recebe.”

Ela finaliza explicando a importância do exemplo como fator que gera mudança no ambiente. “É importante considerar também que costumamos imitar comportamentos ao nosso redor. Um gesto gentil pode estimular a pessoa que o recebe a repetir o mesmo com outros. Mostrar-se desrespeitoso ou não empático estimula no outro emoções negativas, como raiva, irritação, tristeza. Consequentemente, poderá haver afastamento das pessoas envolvidas. Quanto mais desenvolvemos a empatia, solidariedade e gentileza nos diferentes ambientes que convivemos, maiores as chances de sentirmos mais prazer e bem-estar.”

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Colaborador

Por Marcelo Rangel / Fotos: Fotolia, Marcelo Alves, Arquivo Pessoal e Demetrio Koch