Produtos para clarear a pele reforçam ideias racistas

Marca de cosméticos é criticada após comercial mostrar ex-miss negra clareando a pele com creme corporal. Polêmica lembra que racismo ainda está enraizado na sociedade

Imagem de capa - Produtos para clarear a pele reforçam ideias racistas

Em outubro, a marca Nivea se envolveu em uma polêmica após a divulgação da campanha de um creme corporal que promete clarear a pele veiculada em Gana, Camarões, Nigéria e Senegal. Segundo reportagem da BBC, outdoors nos países africanos mostravam a ex-miss Nigéria, Omowunmi Akinnifesi, e a mensagem “para uma pele visivelmente mais clara”. Na televisão, filmes publicitários traziam a modelo ficando com a pele mais clara depois de usar o hidratante chamado “Natural Fairness”, que em português significa “clareza ou brancura natural”. A ex-miss é negra. Afinal, por que uma mulher negra precisaria clarear a pele?

Críticas

A campanha gerou protestos entre usuários de redes sociais em todo o mundo e a marca foi acusada de racismo. A modelo e ativista Munroe Bergdorf compartilhou a publicidade em seu Instagram e disparou: “não é ok perpetuar a noção de que a pele mais clara é mais bonita”. Ela ainda alertou que “ganhar dinheiro para fazer as pessoas se odiarem nunca é aceitável”, acrescentando que os produtos trazem riscos à saúde. “Nos homenageiem, em vez de pedir que aceitemos ideais racistas e inatingíveis”, escreveu.

William Adoasi, fundador de uma marca de relógios londrina, também criticou o vídeo de Nivea em postagem no Twitter que teve mais de 12 mil retweets. Já a jornalista e ativista francesa Rokhaya Diallo disse no Twitter que é um escândalo uma marca vender produtos de clareamento para consumidores africanos. “Devemos boicotar essa marca que não nos respeita”, escreveu.

De acordo com a BBC, a Beiersdorf, empresa dona da marca, divulgou um comunicado dizendo que a intenção não foi ofender consumidores. “Tendo conhecimento do direito de cada consumidor em escolher um produto de acordo com sua preferência, a empresa oferece diversas alternativas de produtos de alta qualidade para cuidados com a pele”, afirmou a nota. Apesar das críticas, a empresa não pediu desculpas pela campanha.

Lucro

Uma pesquisa mostra que as marcas de cosméticos multinacionais encontraram no clareamento de pele um mercado muito lucrativo. O gasto global em clareamento de pele deverá chegar a US$ 31,2 bilhões em 2024, segundo estimativa divulgada em junho pela Global Industry Analysts.

Os cremes branqueadores não são novidade no mercado. Uma reportagem de Mary-Rose Abraham publicada no jornal The Guardian, em setembro, indica que a indústria de cosméticos e procedimentos para clarear a pele vem crescendo ano a ano com base em ideias racistas propagadas nos tempos coloniais para justificar a exploração comandada por potências europeias na Índia e em vários países africanos. Essas ideias ajudam a espalhar a crença absurda de que peles claras são sinônimo de beleza e sucesso.

Riscos à saúde

Os cremes que prometem clareamento de pele podem significar riscos à saúde. Alguns desses produtos contêm hidroquinona, ingrediente potencialmente cancerígeno, embora seu uso seja restrito em muitos países. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o mercúrio também já foi encontrado em alguns desses cremes. Esse componente pode danificar os rins, o cérebro e o sistema imunológico.

Preconceito

Além dos riscos à saúde, os cremes branqueadores trazem uma questão ainda mais grave: o racismo. Embutidos na publicidade, os padrões racistas de beleza acabam desvalorizando o negro e ajudam a reforçar preconceitos contra a cor de pele, o cabelo e as características físicas das pessoas. O racismo gera ódio. O racismo também destrói a autoestima de várias pessoas negras. É o racismo que leva os negros a ter menos oportunidades de educação e salários mais baixos. Até quando vamos permitir que preconceitos sejam usados para garantir lucros e manter privilégios de alguns grupos? Já é hora de criar ações que valorizem o negro e garantam a sua inclusão em todos os espaços da sociedade.

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Colaborador

Por Rê Campbell / Fotos: Fotolia