Cumplicidade na pedofilia

Arcebispo renuncia após ser acusado de acobertar padres. Instituição alega que o afastamento foi motivado por problemas de saúde

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No dia 6 de julho, o arcebispo dom Aldo di Cillo Pagotto, de 66 anos, foi desligado da liderança de suas funções na Arquidiocese da Paraíba, após apresentar sua renúncia. Há três anos, ele vem sendo acusado de acobertar casos de pedofilia na Paraíba. Ele teria abrigado padres e seminaristas afastados de outras dioceses, supostamente pela prática desses abusos.

Após as denúncias, uma investigação foi iniciada em 2015 pela Santa Sé. Desde então, o religioso foi proibido de ordenar padres e diáconos em sua arquidiocese.

De acordo com a agência de notícias France-Presse, ele também estaria mantendo um suposto relacionamento sexual com um rapaz de 18 anos, que teria transtornos mentais. Contudo, ele tem negado todas as acusações.

Apesar de não explicitar os casos, na carta aberta, Pagotto admitiu ter abrigado padres e seminaristas em sua arquidiocese. “Acolhi padres e seminaristas, no intuito de lhes oferecer novas chances de vida. Entre outros, alguns egressos, posteriormente suspeitos de cometer graves defecções, contrárias à idoneidade exigida no sagrado ministério”, explicou.

O papa Francisco aceitou no mesmo dia o pedido e emitiu uma nota citando o Código de Direito Canônico como motivação do afastamento, o que sugere que o religioso vem sendo há muito tempo pressionado: “o bispo diocesano que por doença ou por outra causa grave se tiver tornado menos capacitado para cumprir seu ofício é vivamente solicitado a apresentar a renúncia do ofício”, detalha a nota.

A Arquidiocese da Paraíba atribui a saída de dom Aldo a problemas de saúde, mas, em sua carta, ele não cita que está enfrentando alguma doença. Ele alega apenas limitações e demonstra que os escândalos o pressionaram para tomar a decisão. “Tentei doar o melhor de mim mesmo, não obstante as sérias limitações de saúde, ademais das repercussões no equilíbrio emocional, causadas pela constante necessidade de superar conflitos inevitáveis, advindos de reações ao meu modo de ser e de agir”, escreveu.

Como confiar?

Antes de ser transferido em 2004 do Ceará para a Paraíba, dom Aldo já teve seu nome envolvido em outros escândalos. Em 2002, ele foi acusado de coagir adolescentes para que mudassem seus depoimentos, com o objetivo de proteger um frei acusado de estupro. Após as denúncias, em 2013, começaram as investigações. Mas somente em janeiro de 2015 ele foi a Roma prestar os primeiros esclarecimentos.

Muito tem sido dito na imprensa sobre crimes relacionados a pedofilia e a abusos envolvendo párocos e bispos católicos. Enquanto isso, os processos são morosos, há pouca atenção às vítimas e as punições são lentas.

O anúncio da saída de dom Aldo ocorre seis meses após a estreia no Brasil do longa-metragem Spotlight – Segredos Revelados, vencedor do Oscar de melhor filme, que apresenta uma extensa lista de escândalos de abusos sexuais cometidos por padres, entre eles um monsenhor e seis párocos brasileiros. O filme mostra casos com condenações judiciais, mas alguns em que os réus continuam em liberdade.

Agora, pressionado a pedir sua renúncia, mais um processo relacionado a pedofilia envolvendo a Igreja Católica fica sem desfecho. Como os seguidores de uma instituição religiosa que possui doutrinas estabelecidas conseguirão confiar em seus pregadores, se ela não apresenta regras claras para combater os crimes que estão dentro de seu clero? Casos de exploração de menores nos causam revolta quando cometidos por qualquer pessoa. E o que dizer quando isso ocorre entre líderes de instituições que acolhem tais situações? Tentar salvar o prestígio, os interesses e a autoridade de uma instituição ocultando o crime e o criminoso não só é um equívoco como uma agressão às vítimas.

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Colaborador

Por Janaina Medeiros / Foto: Folhapress