Jogos de azar: uma aposta furada

A proposta de enriquecimento fácil tem iludido milhares de pessoas que, em busca de dinheiro rápido, são capazes de fazer qualquer coisa

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O que você faria se ganhasse milhões de reais na loteria? Quem nunca teve esse desejo? O casal Roger e Lara Griffiths viveu isso: a dupla faturou R$ 5,6 milhões na loteria norte-americana. Contudo, o que era para ser o início de uma vida feliz se tornou uma desgraça. Sete anos após a premiação, eles apareceram nas mídias locais trocando acusações e culpando um ao outro porque todo o dinheiro havia acabado. Além das dívidas, outro prejuízo foi o término do casamento de 14 anos.

Aqui no Brasil uma reportagem realizada pelo programa Balanço Geral, da Record TV, comoveu o País ao mostrar a história do baiano Antônio Domingos, de 46 anos. Na década de 80, ele faturou R$ 30 milhões na loteria e hoje, quase 30 anos depois, afirma que gastou tudo com festas, amigos e ajudando os outros. Atualmente sem dinheiro, ele trabalha como flanelinha para conseguir viver com um mínimo de dignidade.

Assim como o casal Roger e Lara Griffiths e Antônio, milhares de pessoas perdem tudo que ganham em apostas, sorteios e jogos. Para a psicóloga Denise Moreno isso acontece porque a conquista se dá sem muito esforço. “Já diz o ditado que tudo o que vem fácil vai embora fácil e tudo o que vem pelo suor, vem com sabor de vitória e valorizamos mais. Em vez de gastar dinheiro apostando aqui e ali sem obter o mínimo resultado, porque não investir esse valor em uma poupança?”, questiona.

A verdade é que o sonho de conquistar rios de dinheiro de forma rápida é o objetivo de muitos brasileiros. Entretanto, este sonho tem se tornado um pesadelo para muitos porque, enquanto apenas poucos ganham, milhares vendem tudo que têm para manter o vício. O médico psiquiatra Ivan Mario Braun supervisionou o atendimento ambulatorial de tratamento de jogo patólógico do Hospital das Clínica, em São Paulo, durante dez anos e afirma que essa dependência leva as pessoas a ter diversos problemas.

“Já vi muitas histórias tanto de pessoas pobres que deixam de pagar o aluguel e as contas para poder jogar como as com renda elevada que acabam comprometendo sua qualidade de vida e da família porque frequentemente contraem grandes dívidas. Essas pessoas perdem esposas e maridos e há casos até de tentativas de suicídio”, afirma.

Dependência que gera descontrole

Os jogos, assim como as substâncias químicas que viciam, interferem no comportamento das pessoas. “Ocorre um efeito poderoso sobre os sistemas de gratificação cerebral. Por isso, a ocorrência de depressão, ansiedade e dependência de drogas é maior em jogadores patológicos”, explica o médico.

Após sofrer uma desilusão amorosa, a empresária Fátima das Dores da Silva (foto ao lado), de 50 anos, decidiu ocupar seu tempo em bingos e desenvolveu os transtornos citados por Braun. “Estava com 27 anos, frustrada e buscava preencher meu interior. A primeira sensação quando entramos numa casa dessas é que a riqueza está próxima. Eu jogava em caça-
níqueis, videobingo e cartas. Conhecia pessoas famosas que jogavam também e aquilo me influenciava”, relata.

Após meses jogando sem retorno financeiro, a empresária tentava deixar de ir, mas não conseguia. “Os gerentes me ligavam dizendo que eu tinha que estar lá naquele dia porque teriam novos prêmios e eu não resistia ao convite. Lá, passei a beber e a fumar, também conheci muitos jogadores que se suicidaram e enfartaram porque estavam perdendo todo dinheiro que tinham”, lamenta.

O psiquiatra estabelece uma relação importante entre dependência de jogo e o mundo das drogas. “A ocorrência de uso de drogas em jogadores é muito maior. Por exemplo, o uso do tabaco é relatado em até 80% de amostras de jogadores contra cerca de 20% ou menos em pessoas da população geral”.

Além de fazer uso das substâncias, Fátima começou a mentir para os familiares. “Eu inventava que ia para outro lugar, mas minha família sabia. Meus parentes começaram a me seguir. Minha vida foi assim durante dez anos. Até que ganhei muito dinheiro, mas depois perdi tudo”, acrescenta.

Para que conseguisse saldar as dívidas com os jogos, ela deu quatro carros e vendeu a empresa que tinha. “Sem falar que meu apartamento foi para leilão. Fiquei com depressão profunda e tudo que pensava era em me matar”, fala.

O suicídio só não aconteceu porque sua cunhada a impediu ao lhe fazer um convite. “Quando ninguém mais acreditava mais em mim, ela acreditou e me disse para ir à Universal e que lá poderiam me ajudar. Entrei onde nunca imaginei entrar um dia. Eu tinha raiva da igreja, mas foi lá que minha vida mudou. Venci meu problema espiritual, recebi orientações valiosas e passei a participar das palestras semanais”, destaca.

Hoje, ela descobriu que a melhor maneira de ganhar dinheiro é trabalhando e decidiu investir todas as forças em um novo negócio. “Sou empresária no ramo alimentício e tenho meu próprio restaurante. Conquistei, por meio do esforço, dois lindos apartamentos e, acima de tudo, a paz e a família unida. Não tem presente melhor do que deitar todos os dias com a consciência tranquila de quem está andando no caminho certo, no caminho de Deus”, conclui.

O trabalho da cura dos vícios

O especialista em dependência química e também bispo Cláudio Lana afirma que a raiz de todo e qualquer vício é espiritual, além de física e emocional. “Assim como o viciado em crack diz ‘é só mais uma pedra’, o viciado em jogos diz ‘é só mais uma ficha, é só mais uma carta. Agora eu vou ganhar’. Cria-se uma dependência psicoemocional que o escraviza e, mesmo tendo prejuízos e perdas, ele não consegue parar”, explica.

Ele revela que tem acompanhado muitos casos de cura e diz que há uma maneira eficaz para quem busca tratamento. “No caso de jogos, as pessoas não ingerem nem injetam nada em seu organismo, não há uma substância, mas há algo que domina a mente. Chamamos isso de obsessão. A única forma de cura é libertar a mente delas dessa obsessão”, completa.

O operador Jean Carlos Custódio Pereira (foto ao lado), de 38 anos, passou pelo Tratamento para Cura dos Vícios e afirma que conseguiu vencer esse vício que o oprimiu por mais de 15 anos. O ano era 2003. Em meio a tristeza por estar desempregado, ele acreditou que os cupons da loteria poderiam ajudá-lo a vencer aquele período difícil. “Estava com 25 anos quando me viciei em jogo do bicho, loterias e talões de sorteio de carros. Passava o dia traçando estratégias para vencer”, lembra.

Aos poucos, a boa convivência com a esposa e a filha se tornou algo raro e o sonho do dinheiro rápido se transformou em mais um pesadelo financeiro para a vida de toda a família. “Cheguei ao ponto de contar moedas e até a pedir para jogar fiado. Já apostei R$ 800 de uma vez. Comecei a beber e a fumar também. Isso gerou muitas brigas e ninguém confiava mais em mim”, diz.

Em meio ao desespero, a filha o convidou para participar do Tratamento para Cura dos Vícios e ele, sabendo do problema que tinha, aceitou ir. “Foi incrível! No primeiro domingo que fui à palestra já fui curado e não tive mais vontade de jogar, mas os pensamentos da vida que eu tinha antes persistiam. Para eliminá-los procurava orar e pensar somente em fortalecer a minha fé”, diz.

Hoje, um ano e quatro meses depois, ele conta que está recomeçando a vida profissional. “Retomei a confiança da minha esposa e filha. Conquistei os bens materiais que o vício não me permitia ter. E agora estou me preparando para abrir meu próprio negócio”, declara.

Legalizar ou não?

A Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional do Senado aprovou recentemente um projeto que legaliza jogos de azar, como bingos, apostas eletrônicas e jogo do bicho, entre outros, em todo o território nacional. O texto afirma que a exploração de jogos de azar constitui serviço público. Ele deve passar pelo plenário do Senado e depois na Câmara.

“O jogo é proibido no Brasil desde 1946 basicamente por questões de valores morais mais do que por documentação científica dos problemas que causam. Mesmo assim, calcula-se que no Brasil, ao longo da vida, cerca de 1,3% das pessoas vá desenvolver jogo patológico ou problemático, o que, aplicado à população brasileira de mais de 200 milhões de habitantes, levaria a números acima de 2,5 milhões pessoas!”, aponta Braun.

Como vencer na vida sem precisar de “sorte”

A exigência de pouco esforço para ganhar dinheiro é o que atrai pessoas para jogar desde um simples bilhete até fazer grandes apostas. A possibilidade dessa gratificação imediata tem feito com que milhares caiam nas armadilhas dos jogos de azar, desde a origem deles em Roma.

A própria palavra “azar” já traz um grande alerta. Afinal de contas, tudo que depende de “sorte” e oferece enriquecimento rápido deve ser olhado no mínimo com desconfiança. A Bíblia é clara ao falar desse assunto e traz a resposta mais direta e incisiva para ajudar quem sofre com esse tipo de vício: “Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos e sê sábio. Não tendo ela chefe, nem oficial, nem comandante, no estio, prepara o seu pão, na sega, ajunta o seu mantimento. Ó preguiçoso, até quando ficarás deitado? Quando te levantarás do teu sono?” Provérbios 6:6-9.

O sucesso vem do suor e, principalmente, do bom uso da inteligência. Conquistar a verdadeira prosperidade exige sabedoria. Então, lute para alcançar o sucesso financeiro, sim, mas por meios corretos, vá pelo caminho da fé, da perseverança e do trabalho. Dessa forma, a vitória é certa.

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Colaborador

Por Ana Carolina Cury / Fotos: Fotolia e Marcelo Alves / Arte: Edi Edson